«O retrato publicado há dias neste jornal sobre o número de portugueses que dependem do Estado para viver é ao mesmo tempo assustador e reconfortante. Assustador porque, se a cifra já era expressiva antes da pandemia (cerca de 5,6 milhões de pessoas), evoluímos entretanto para patamares invulgares: sete milhões de cidadãos contam agora com algum apoio público para se manterem à tona. Mesmo considerando que possa haver duplicação de prestações sociais, falamos de dois terços da população. É esmagador. Mas estes números acabam também por nos trazer algum conforto, na medida em que, apesar da nossa pequenez geográfica e fragilidade económica (a que devemos somar a teia burocrática que agrilhoa tantos serviços públicos), ainda fomos capazes desta proeza. Na gigante Espanha, estima-se que durante a pandemia "só" 40% dos cidadãos estejam a ser apoiados.
Ora, escusado será dizer que nenhum Estado aguenta muito tempo um nível de esforço desta magnitude. Mas, chegados aqui, também é escusado dizer que esta crise maldita tornou evidente que não temos grande alternativa ao Estado quando tudo o resto falha. Não enquanto as famílias não recuperarem rendimentos que lhes permitam escapar à miséria. Não enquanto a atividade económica e as empresas não começarem a respirar um pouco melhor.
Sobre isto, vale a pena recordar o que disse o economista José Reis: "Tudo o que estava protegido pelo trabalho ficou desprotegido. E o único instrumento que temos hoje é o Estado. Não são as empresas, nem o capital, nem a Banca, nem os offshores. Andámos anos a tecer loas ao capitalismo e, afinal, quem não falhou foi o Estado". A claque dos liberais empedernidos dirá que é para isto que pagamos impostos. A claque dos socialistas efervescentes rejubilará com a imagem do "sonho bolivariano" tornado realidade.
A verdade, porém, é bem mais complexa do que qualquer dicotomia ideológica primária. Nem os recursos públicos são infinitos, nem a nossa capacidade de pagar impostos é inesgotável. Portanto, o que quer que seja o Estado depois disto, terá de ter ainda mais em conta o difícil equilíbrio entre estes fatores. Sairemos mais pobres desta borrasca e, porquanto, forçados a aprimorar não só os mecanismos de financiamento dos cofres públicos, como (e mais importante) os critérios que definirão os destinatários preferenciais do nosso esforço contributivo. Salvemos vidas e empregos no imediato, mas não nos esqueçamos de que haverá, no futuro, mais portugueses para salvar. Sobretudo os mais frágeis de entre nós, para quem o Estado é mesmo a única família.»
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3 comments:
Por norma,estes artigos catastrofistas sobre esgotamento dos recursos do Estado,englobam,como por acaso,as despesas da Segurança Social...
Falam das despesas da Segurança Social,nunca citando os proventos dessa mesma organização. Se soubermos que eles são 40% de todos os salários pagos no País,todos os salários,que crescem na conta sem pagar um cêntimo de juros seja a quem fôr,fica-se com a certeza que é o melhor provento que a Nação tem. Disputado por todos os Fundos Privados com capacidade para o gigantesco e infindável negócio.
As lágrimas sobre o esgotamento dos Estados têm sempre uma intenção. Já cá andamos há tempo que chegue para as toparmos à légua.
Temo que a situação vai ainda piorar ... e muito.
Se surgir uma nova vaga do covid-19, como penso que vai haver, vai ser o caos total. Oxalá me engane...
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Cumprimentos
Cuide-se
A bota não bate com a perdigota. Que realidade é essa?.Escrever é um ofício e escrever para um jornal é uma profissão e escrever todos os dias uma obrigação.
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