21.7.20

Ao Pingo Doce sabe bem pagar tão pouco



«Um acordo europeu para medidas de urgência de resposta à crise (se existir) não é um ato de "solidariedade" e quem assim o apresenta apenas alimenta uma caricatura: transferências do grupo "frugal", liderado pela Holanda, para os "esbanjadores", que Portugal integra.

A ideia da "solidariedade" é errada, em primeiro lugar, porque a UE tem capacidade para financiar um ambicioso plano de recuperação através do BCE, sem exigir qualquer outra transferência entre países.

Em segundo lugar, porque o que os países europeus precisam é de instrumentos para lidar com a crise. A integração europeia eliminou e/ou centralizou esses poderes (como a emissão de moeda) e agora os "frugais" sequestraram-nos. Aos países que necessitem de financiamento, querem impor um programa liberal-autoritário, mesmo se essa não foi a escolha democrática dos seus povos. Uma espécie de servidão por dívida, já não à troika mas agora à Holanda (o que não parece desagradar a direita em Portugal, a julgar pela palavras de Rui Rio). Não deixa de ser irónico que o projeto europeu seja posto em xeque por governos da família socialista, mas esse sempre foi o prognóstico de quem, à esquerda, criticou a UE: uma Europa que, uma e outra vez, falha aos seus povos está condenada ao fracasso.

A ideia de um acordo europeu como ato de solidariedade é, finalmente, errada porque a "frugalidade" que tornaria os Países Baixos moralmente superiores é obtida à custa dos impostos que deveriam ser cobrados em outros países europeus. Todos os anos, o paraíso fiscal holandês cobra 10 mil milhões de impostos sobre os lucros que são desviados dos restantes países da UE. Um regime que nenhum país bloqueia, devido à livre circulação de capitais na UE, e que não é alterado porque os Países Baixos têm o poder de vetar legislação fiscal a nível europeu. Se considerarmos que a contribuição líquida dos Países Baixos para o orçamento europeu é de 4,9 mil milhões, o nosso parceiro "frugal" do centro da Europa é afinal financiado anualmente em 5 mil milhões de euros por estados como Portugal, que veem essa receita desaparecer das suas contas públicas.

Esta hipocrisia é a mesma que, ao longo dos tempos, serviu as maiores empresas portuguesas: ao mesmo tempo que exigiam em Portugal leis e regras à medida dos seus interesses, não hesitaram em registar as suas sociedades em Amsterdão. Entre elas estão todas as maiores da Bolsa portuguesa. Em período de crise, o que se pede a essas empresas não é solidariedade. É apenas decência: mudem as vossas sedes para Portugal e paguem cá os vossos impostos.»

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6 comments:

Victor Nogueira disse...

A CGD, como banco público, paga mesmo os impostos fora de Portugal, segundo dá a entender o cartoonista? E todos os bancos privados pagam os seus impostos em Portugal? Pois parece-me que os ratos são as "empresas" que pagam os impostos na Holanda.

Joana Lopes disse...

um cartoon é um cartoon...

Victor Nogueira disse...

Pois mas o cartoonista é "lido", interpretado. Porque pode perguntar-se, face ao desenho: Olha, olha, a CGD e o BES estão entre as ratazanas que pagam impostos na Holanda. E logo de seguida, surgir uma interrogação. "Será que toda a banca privada paga os impostos em Portugal e não na Holanda ou em qualquer outro paraíso fiscal" ? Porque associar à ratice o BES (que até já nem existe, como firma) e a CGD (apesar desta, embora pública, ser gerida como se privada fosse?) :-)


JSM SUAVE E NAS TINTAS disse...

A resposta é muito simples:acabem com a a ditadura fiscal: não só aumentamos o valor tributável como atraímos - tal e qual os holandeses - mais capital tributável de outros países!

joão viegas disse...

Eu acho tibia a solução proposta pelo suave comentador aqui em cima. Porque ficar tacanhamente no âmbito fiscal. Generalizemos e tenhamos assumidamente a audacia dos fortes :

- Prostituição dos pobres menores de 30 anos e venda dos orgãos ainda em bom estado dos de maior idade,
- Utilização da nossa marinha militar para capturar navios no alto mar e açambarcar a mercadoria e/ou os passageiros, consoante o que render mais dinheiro,
- aproveitamento racionalizado das gorduras dos deficientes, dos velhos e dos doentes em fase terminal para fazer sabão

Pensando bem, podemos fazer muito melhor do que os pindéricos dos Holandeses !

Boas

JSM SUAVE E NAS TINTAS disse...

Nem mais. As regras do jogo não foram aprovadas por mim. Foram aprovadas, em representação de Portugal, por socialistas e sociais-democratas. Pois bem, joguemos o jogo e deixemo-nos de queixinhas de crianças mimadas!
Cumprimentos