«Outra consequência deste endividamento comum é ele ter de andar em paralelo com o estabelecimento de uma união política. Não só historicamente sempre assim foi (nas cidades renascentistas italianas, os parlamentos desenvolveram para assegurar a contração, gestão e pagamento de dívida pública) como a União terá necessidade de tomar decisões comuns acerca de como recolher estes recursos e como os aplicar. E para tal há que garantir que numa união política todos os Estados respeitem o Estado de direito. Daí que a cimeira dos últimos dias tenha acabado por dar um passo importante num outro tema que os leitores habituais desta crónica conhecem bem: como garantir que os valores consagrados logo no artigo 2 do Tratado da União Europeia — democracia, estado de direito, direitos humanos — são respeitados em tudo o que a União e os seus Estados-membros fazem? Desse ponto de vista, ainda bem que não levou vencimento a posição de António Costa na semana passada (mas não do governo português, aparentemente) de que se deveria desligar valores e dinheiros. Não só não se devem desligar valores e dinheiros como não se devem desligar valores e nenhum outro programa da União. O problema foi o Conselho ter empurrado com a barriga a questão dos valores da União até ao momento em que foi preciso unanimidade para decidir de dinheiros. As conclusões acabaram por ficar com uma formulação atenuada mas suficientemente clara para dizer o seguinte: terá de haver uma proposta de condicionalidade para o orçamento e o fundo de recuperação ligada aos valores do artigo 2 e essa não pode ficar dependente da unanimidade.
Orbán bem pode proclamar vitória por o assunto não ter ficado ainda fechado, mas a verdade é que agora depende da nossa pressão sobre as presidências alemã e portuguesa que esse mecanismo de defesa do Estado de direito se vote, depressa e forte. E temos de garantir que Portugal tenha um papel ativo nesse campo.»
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