«Entrego à quinta a crónica de sábado. Esta semana, não foi exceção e, de acordo com o que se sabe hoje (quinta-feira), amanhã (sexta) o INE divulgará as suas estimativas sobre a evolução do PIB no segundo trimestre do ano. É provável que o leitor saiba mais do que eu. De todo o modo, a não ser que haja uma boa surpresa, o PIB deu um tombo de todo o tamanho. Provavelmente entre os 12 e os 15%.
Já no trimestre anterior, de acordo com as estimativas do INE, o PIB tinha caído 2,3% relativamente ao primeiro trimestre de 2019. O que assusta é que toda a quebra se deveu a março. Não temos dados mensais para o PIB, mas temos outros e muitos mostram que, nos primeiros dois meses do ano, a economia funcionava bem. Por exemplo, as exportações de bens, em janeiro, tinham aumentado 4% face a janeiro do ano anterior. Em fevereiro, tinham aumentado ligeiramente. Março foi o primeiro mês de queda. Caiu 13%. Olhando para o índice de horas trabalhadas na indústria, observamos um aumento de 10% em janeiro, em fevereiro uma estagnação e, no mês seguinte, uma quebra de 4%.
O mau mês de março foi suficiente para levar a uma quebra no PIB trimestral superior a 2%. No segundo trimestre, teremos, não um mau mês, mas sim três meses péssimos. Para se ficar com uma ideia, as exportações de bens, que em março tinham caído 13%, caíram 40% em abril e maio. Fala-se muito na quebra do turismo, mas nem procurei esses dados para não me deprimir mais. Os números do PIB para o segundo trimestre, que, repito, não conheço, deverão alertar-nos para a necessidade de a economia recuperar. Caso contrário, será uma catástrofe. Mas, dada a forma como discutimos o combate à covid, parece-me que não temos essa noção.
Desde março, o nosso conhecimento evoluiu em diversos sentidos: sabemos que a doença é menos grave do que se temia, somos mais eficazes no seu tratamento e as consequências económicas do confinamento são muito mais devastadoras do que as antecipadas. Bem sei que agora todos pensam que desde o início sabiam que ia ser uma catástrofe, mas não é verdade. Quando, em meados de março, num programa de TV, eu disse que, na melhor das hipóteses, o PIB de 2020 cairia 5%, a maioria das reações que recebi era a de que estava a ser catastrofista. Quando, a 21 de março, o Expresso fez uma sondagem a 10 economistas, daqueles muito famosos, um deles previu um crescimento de 1% para este ano.
Face a nova informação, é razoável rever as nossas políticas. Se o vírus, afinal, é mais manso, se a terapêutica melhorou e se o confinamento é desastroso, a atitude racional é não reagir de forma igualmente draconiana caso haja uma nova vaga.
Infelizmente, racionalidade e histeria são incompatíveis. E, neste momento, observamos essa histeria em vários domínios. No terceiro período, que agora acabou, dez das escolas reabertas fecharam por causa de alguns casos de covid. O que é extraordinário é que bastava haver um caso que viesse de fora da escola para a encerrar. Uma que fechou sem haver nenhum caso. Simplesmente, a histeria era tanta que um surto num lar de idosos levou ao fecho da escola e das creches dessa região. E, tendo o líder do principal sindicato de professores a gritar nas ruas que os professores não serão “carne para covid”, não é de esperar que haja mais razoabilidade no próximo ano.
Na Madeira, obrigam as pessoas a andar de máscara mesmo na rua. Em Leiria, criou-se a polícia anti-covid para patrulhar o concelho, dizendo a toda a gente para usar máscara na rua. Isto em pleno Verão. Como diz o meu irmão, chegaremos ao Outono com cara de cu.
Por todo o país, os parques infantis continuam fechados. As discotecas vão fechar às 8h da noite — eu nem sabia que abriam antes disso, para ser sincero. Hospitais públicos e privados funcionam a meio gás, alguns nem isso, por causa da covid. Para garantir que os hospitais não deixam de funcionar por causa do coronavírus, impede-se que os hospitais funcionem. É um curto-circuito na lógica.
Tudo isto é desproporcional. Era bom que nos convencêssemos de que a covid não desaparecerá. Vai haver novos casos e não podemos entrar em histeria de cada vez que forem reportados. O medo do desconhecido é real, mas compreendam que a reação das democracias a uma crise económica e social como a que estamos a provocar também é desconhecida. Falar em quebras do PIB a rondar os 15% é falar do risco de, em breve, haver milhares de portugueses a passar fome. Tenham noção.
Fico com a ideia de que os fundos da União Europeia têm tido um efeito péssimo na discussão pública. Parece que a recuperação económica dependerá desses fundos. Lamento, mas não. A recuperação económica dependerá de voltarmos a trabalhar e a produzir. Tudo o resto é paliativo.»
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2 comments:
E os casos positivos que todos os dias são na casa das duas centenas não contam? E as sequelas que o vírus vai deixar para o resto da vida? Esse senhor que fale por ele mas eu, que tenho asma, se apanhar o vírus não me safo...
Pruduzir mais e exportar para onde se os nossos principais clientes estão a sofrer quebras semelhantes à nossa e alguns ainda bem pior?
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