4.3.21

Como será a nossa vida depois do pesadelo?

 


«Todos fomos surpreendidos pela chegada desta pandemia. Pela dimensão, fruto da capacidade de transmissão da covid-19, e pela rapidez com que nos atingiu. No início de Janeiro de 2020, as autoridades de saúde davam a notícia desta nova doença, ligada a hábitos estranhos dos chineses, que comem morcegos e pangolins. Nunca tinha ouvido falar dessa longínqua cidade de Huang, apesar de ter 12 milhões de habitantes, pelos vistos com infra-estruturas muito modernas, mas manias ancestrais. Considerava-se que a maleita não chegaria cá, a esta Europa tão civilizada como distante. Ainda me lembro da análise que se fazia ao vestuário dos chineses, que incluía as máscaras de cores garridas, que conhecíamos das nossas viagens exóticas. Talvez protegessem os chineses do ar poluído dos seus motores ruidosos, mas não tinham valor para evitar a propagação dessa nova doença. Enfim, é impressionante como nos enganamos! A velocidade com que esta pandemia se tornou global, parece estar ligada ao tráfego aéreo, que tardamos a proibir, se é que isso ainda era possível. As grandes pandemias que conhecíamos, a última há mais de um século, viajaram de barco para todo o mundo. Esta, rasgou os céus, em velocidade de cruzeiro low cost.

Esta situação opressiva que vivemos, vai acabar por passar, apesar das variantes inevitáveis dos vírus, que irão surgindo. As vacinas, que passaram por ser a afirmação da vitória do espírito europeu, até se tornarem no seu maior embaraço, vão acabar por chegar. A razia dos mais velhos, em conjunto com a legião dos imunizados, servirão de “corta fogo”, para termos algum descanso. Não vai ficar tudo bem, mas iremos sobreviver, como sempre. A dúvida que permanece é se aprendemos alguma coisa, depois desta catástrofe que se abateu sobre nós, e nos infernizou a vida, mais de um ano seguido.

A maior parte dos amigos com que partilho esta inquietação, garante-me que vai voltar tudo ao mesmo, talvez ainda de forma mais exuberante. Festas suadas de milhares de pessoas, compras desenfreadas, viagens intercontinentais em promoção. Parece que assim foi noutras pandemias, talvez porque a geração que as apanhou considera que o aperto não se repetirá nas suas vidas, e é preciso esquecer.

Gostava muito que desta vez não tivessem razão. O Homem, como ser inteligente que é, aproveitaria o confinamento para concluir que não precisa de renovar o guarda roupa em todas as estações, que pode fazer muito trabalho em casa e não precisa de voar para o outro lado do mundo, por uma reunião de três dias. O nosso modelo de desenvolvimento, está posto em causa. Mesmo para quem pode gozar com o aquecimento global, procurando os lugares aprazíveis que o dinheiro pode comprar, não escapa às novas pragas, em muito geradas pelas alterações do clima. E, agora, as pandemias podem ser mais frequentes e apoquentar mais vezes uma mesma geração. Estou com um otimismo contido. Talvez este abalo brutal tenha feito a humanidade repensar o mundo.»

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