19.7.21

Os direitos são iguais em Budapeste ou no Mediterrâneo

 


«A União Europeia (UE) tem problemas com dois tipos de tiranetes e com dois tipos de direitos humanos. Aqueles que estão no meio de nós, que desconstroem os valores de uma democracia e do Estado de direito (nos quais a UE tem especial apreço em dizer que são inalienáveis) e aqueles que a circundam e usam os movimentos migratórios para a chantagear (sem respeito pelo que é um ser humano).

A UE lida com a Hungria e a Polónia com a delicadeza diplomática que decorre do facto de serem Estados-membros, censura aqui, admoesta ali, e avança com a “abertura de um procedimento de infracção”, devido à inaceitável homofobia dos dois governos.

O alargamento a leste teve este efeito de dividir um bloco que se queria unido. Pode ter sido uma opção economicamente proveitosa para os países do Norte da Europa, e pode ter sido uma opção obrigatória pós-URSS, mas as sinuosas democracias da Hungria e da Polónia desfazem a coerência interna e prejudicam a importância externa da UE.

Neste capítulo, a presidência eslovena do Conselho da União Europeia tem tudo para ser nociva. A diversidade da UE já foi benigna; hoje é uma prova de malignidade. O denominador comum entre países culturalmente diferentes entre si, que querem e devem preservar as suas diferenças, é aquilo a que o primeiro-ministro da Eslovénia chama os “valores europeus imaginários”.

Por outro lado, a UE não sabe como lidar com a chantagem nas suas fronteiras, seja com a Turquia, Bielorrússia ou Marrocos, que o fazem por pressão política e desejo de represália. Porque o processo de adesão de um país foi suspenso, porque foram aplicadas sanções a outro — por ter desviado um avião europeu no espaço aéreo europeu —, ou, então, porque um Estado-membro tratou à socapa o líder de um movimento de libertação de um território ocupado. A táctica de “despejar seres humanos” nas fronteiras alimenta-se e alimenta o receio primário ante o migrante nas sociedades europeias.

Todavia, a UE pode descartar as suas responsabilidades nos campos de detenção na Turquia ou, mais escandalosamente, na Líbia? O que a Amnistia Internacional relata sobre este último caso é absolutamente escabroso e é ainda mais escabroso que os seus relatos de violações, tortura e mortes arbitrárias sejam ignorados. Pior, é inadmissível que a agência europeia para a gestão das fronteiras externas seja suspeita de cumplicidade na devolução forçada de migrantes à Líbia.

Nem o esforço de sobreviver merece respeito. A UE deveria ter um problema de consciência. Em Budapeste ou no Mediterrâneo, os direitos humanos são os mesmos.»

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1 comments:

Monteiro disse...

União Europeia, Hungria, Polónia em 2021 e Alemanha, Polónia em 1941. A diferença são cerca de 80 anos e algumas encenações pelo meio e cá vou ouvindo o Strauss que as valsas ainda são a música que me faz sonhar com a destruição do imperialismo, a bem dos povos, quiçá do proletariado.