13.9.21

Jorge Sampaio e a “malta de 62”

 


Nós, “a malta de 1962”, perdemos no dia 10 de Setembro um dos nossos, o Jorge Sampaio.

É muito comovidamente que aceitamos a ideia de que deixamos de o ver e ouvir como pessoa presente. E que temos que o transformar em memória, como a de outros que já partiram. Mas este, que é um de nós, ganhou, ao longo dos quase sessenta anos de verdadeira comunhão de experiências e convivialidade de um grupo muito alargado, uma simbologia muito especial. Ao longo destes sessenta anos decorreu História.

Em 1962 eramos um grupo de jovens que olhávamos à volta e víamos: proibição de associações, polícia nas Faculdades, censura, prisões, “bufos” que nos faziam desconfiar de qualquer desconhecido. E também a proibição de celebrar o Dia do Estudante. Alguns foram mais longe e perceberam que tinha que ser travada a luta pela Liberdade. Alguns dias depois já não eram só alguns, mas toda a Universidade que estava de pé.

Jorge Sampaio era então o secretário-geral da RIA (Reunião Inter-Associações) e assumiu a liderança do movimento, com um conjunto de amigos de várias Faculdades. E assumiu, com as características que lhe eram próprias. Não era o “chefe”. No grupo dirigente analisava, discutia, decidia com o colectivo. E para a multidão, porque o era, no estádio universitário, falava com as palavras certas e inclusivas de quem estava em frente de socialistas, comunistas, republicanos, católicos, ou, na sua maioria, jovens que procuravam o caminho para lutar pela Liberdade. Este grupo orgânico, que não era partido nem movimento, ficou cosido entre si pelo espírito de Jorge Sampaio.

A História e a vida vieram dar-nos razão que podíamos escolher Jorge Sampaio como símbolo. Esteve no Tribunal Plenário a defender presos políticos de forma solidária. Esteve nas Comissões Democráticas Eleitorais de Lisboa em 1969.Foi eleito presidente da Câmara Municipal de Lisboa, antecipando a unidade política de Esquerda, que lhe era tão cara. Mas abriu à direita, a quem quisesse colaborar. E, finalmente, foi eleito Presidente da República. Discreta e serenamente ousou dissolver o Parlamento quando o estado do Governo, aliás de substituição, ultrapassou o admissível.

Ousou como chefe supremo das Forças Armadas que não participassem na invasão do Iraque. Com que antecipada perspicácia e sabedoria o fez.

E é simbólico que tenha corrido a meio da noite, sem seguranças, sozinho na cidade, para salvar Timor.

E poucos dias antes de desaparecer apelava à Solidariedade para sírios e outras vítimas da guerra que não era deles.

Em todos estes momentos, “a malta de 1962”, dos vários matizes políticos, esteve com ele. Representava-nos.

Jorge Sampaio, o “nosso” secretário-geral da RIA, nunca deixou de nos honrar com a sua presença nas diversas comemorações do Dia do Estudante que levámos a efeito, mostrando sempre grande disponibilidade. E quando, já no final do seu segundo mandato, faz uma comemoração do 25 de Abril no Pavilhão de Portugal, não se esquece de convidar os seus velhos companheiros, “a malta de 62”. E todos sentimos como Jorge Sampaio privilegiava, uma vez mais, os sentimentos da amizade e da solidariedade.

No próximo ano vai faltar ao nosso encontro, que será o do 60.º aniversário da Crise Académica de 1962, e que se realizou todos os anos até à pandemia. Sem sectarismos nem espírito fechado. Éramos, somos, inclusivos, no espírito de Jorge Sampaio. Outros desapareceram e estão connosco. Jorge Sampaio vai estar sempre presente.

Pela Malta de 62,

Adalberto Casais Monteiro
Álvaro Soares de Almeida
Ana Benavente
António Correia de Campos
António Curvelo-Garcia
António Morais Arnaud
Artur Pinto
Carlos Alberto Sequeira
Carlos Macedo
Eliana Gersão
Feliciano David
Fernando Figueiredo
Filipe Carmo
Filipe Rosas
Francisco Leal Paiva
Helena Cabeçadas
Helena Pato
Herculano Ferreira
Graça Aníbal
Graça Ferreira
Inácia Neves
Isabel do Carmo
Joana Lopes
Joaquim Alexandre Ribeiro
Jorge Freire
Jorge Vasconcelos
José Brandão
José Guimarães Morais
José Carlos Abrantes
José Manuel Calafate
José Zaluar Basílio
Leonor Baeta Neves
Lúcia Ezaguy
Lucinda Vinagreiro
Luísa Corte-Real
Manuel Barata Simões
Manuel Macaísta Malheiros
Margarida Amaral Freire
Maria Eduarda Colares
Maria Eduarda Cortez
Maria Eugénia Malheiros
Maria João Gerardo
Maria da Luz Lima
Maria Manuel Calvet Ricardo
Maria Margarida Silva
Maria Otília Frazão
Maria da Piedade Ferreira
Mário Lino
Maximiano Gonçalves
Miracel de Lacerda
Noémia de Aríztia
Pedro Germano
Pedro Borges
Tereza Bento
Teresa Trigo de Sousa
Vera Adão e Silva
Vítor Matias Ferreira
Yolanda Barbosa 


(Publicado AQUI)
.

0 comments: