«No dia 24 de setembro, Mia Amor Mottley, a primeira-ministra dos Barbados, proferiu um discurso notável nas Nações Unidas. Com palavras fortes, questionou todos, incluindo ela própria, sobre até quando, ou quantas mais vezes, se iam encontrar para proferir os discursos de sempre, com mensagens mais ou menos relevantes, mas sem qualquer consequência ou qualquer ação concreta e eficaz.
O discurso da senhora Mottley não se focava num assunto em particular, mas numa panóplia de assuntos de que todos já ouvimos falar vezes sem conta, mas relativamente aos quais nunca vemos nada de facto a acontecer. Entre as muitas perguntas feitas por Mottley saliento duas a título de exemplo, mas aconselho a todos que as oiçam na íntegra: “Quantas mais mortes terão que existir ou mais variantes terão de surgir para que haja um plano concertado de vacinação global no mundo, em vez de um armazenamento de vacinas em excesso pelos países mais desenvolvidos?” ou “Quantos graus terão que subir na temperatura global do nosso planeta para que acabemos com os combustíveis fósseis?”
Depois das muitas perguntas elencadas, a resposta não se fez esperar, e essa é sem dúvida um dos vários pontos altos do exercício feito por Mia Amor Mottley. “Nós temos os meios para providenciar vacinas para todos os adultos do planeta, nós temos os meios para investir de forma a proteger as populações mais vulneráveis do globo das alterações climáticas, mas escolhemos não o fazer.” Ou seja, por outras palavras e para que fique bem claro, nós proferimos discursos em que nos mostramos preocupados com os mais diversos problemas, criamos cimeiras ad nauseam para fazermos crer que estamos mesmo muito preocupados com essas questões em concreto, mas no momento da ação escolhemos nada fazer, ou pior ainda, fazer muito poucochinho para nos convencermos de que fazemos o melhor possível. Dessa forma, vivemos num permanente “olhem para o que eu digo, não olhem para o que eu faço”, um constante clima de hipocrisia.
Esta forma de estar, esta escolha de muito dizer mas nada fazer, é feita pelos nossos líderes, por aqueles que nós escolhemos para nos representarem, mas que vivem numa constante atitude de duplicidade. E isto foi terrivelmente visível na recente cimeira do clima COP26. Desde 1995, em Berlim, que se realizam anualmente estas cimeiras porque, há mais de duas décadas que estamos cientes de que temos um problema grave, muito grave mesmo, provavelmente o maior e o mais urgente problema que alguma vez enfrentámos como Humanidade. Também sabemos e é frequentemente afirmado nos mais diversos discursos, que o problema cresce a olhos vistos a cada dia que passa, e que muito pouco se faz para o resolver. E, no entanto, tivemos líderes que se reuniram para esta cimeira sem ter em atenção as suas ações individuais, a usar formas de transporte altamente poluentes, a participar em refeições com enorme desperdício. Mas, acima de tudo, tivemos líderes que se dão por satisfeitos com um consenso que resulta apenas numa ação tão ínfima que nos devia envergonhar a todos.
Mais uma vez, nas palavras da senhora Mottley, “precisamos de liderança global, porque os nossos problemas são globais, moral, porque temos de fazer o correto, e estratégica, porque não podemos resolver todos os problemas do mundo, mas devemos resolver aqueles dentro do nosso alcance imediatamente”. Eu acrescento: precisamos de líderes que liderem pelo exemplo e que ajam de acordo com as suas palavras. E para isso, pelo menos nos países onde a democracia prevalece, devemos exigir compromissos firmes dos nossos líderes, penalizando nas urnas os que dizem muito, mas pouco ou nada fazem!»
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