«Vale a pena revisitar o discurso que Putin fez na segunda-feira e o longo artigo que escreveu em junho do ano passado, onde defendeu que “os russos e os ucranianos são um só povo”. Repetindo alguns argumentos estalinistas contra as cedências de Lenine às nacionalidades e baralhando períodos históricos, escreveu que, “sob o pretexto de combater o chamado chauvinismo da grande potência russa, a ucranização foi imposta àqueles que não se viam como ucranianos”. Para concluir que “a Rússia foi roubada”. Os crimes e as campanhas de fome do estalinismo ou a proibição de referências culturais e do ensino de ucraniano nas escolas não estão no artigo do historiador autodidata. É a narrativa histórica de Putin, que corresponde a verdades feitas na cultura popular russa, que dá forma a este expansionismo. O nacionalismo que exalta a “glória” do passado e esquece os seus crimes prepara os crimes do futuro para continuar a sua “glória”. É assim que Putin vinga a derrota russa do fim do século passado, criando um contínuo entre Ivan IV, Catarina II, Estaline e ele próprio.
Não será por adesão ideológica a Putin, mas porque o seu quadro teórico não serve para este tempo, que o PCP tem uma posição anacrónica neste conflito. Do lado de cá estão os EUA, e os comunistas querem vingar, três décadas depois, a sua derrota. Mas, na verdade, não é mais anacrónico do que ver neste conflito a reedição de um confronto entre modelos políticos. Compreende-se. Ninguém pensa com os paradigmas do futuro. (…)
De uma forma ou de outra, Putin terá de pagar por este crime ignóbil, respondendo perante o mundo, os ucranianos e os russos. Horas depois de a guerra ter começado, é impossível saber como isso acontecerá. Como reagirão os russos, os ucranianos e a comunidade internacional a este ataque.»
Daniel Oliveira
Expresso, 25.02.2022
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