8.8.22

De que estamos à espera para taxar os lucros caídos do céu?

 


«Há quem esteja a lucrar milhões com a guerra e a pobreza dos outros e Portugal ainda hesita sobre o que fazer, com a excepção de mandar João Galamba validar facturas.

António Guterres foi esta semana particularmente duro, em Nova Iorque, quando afirmou ser “imoral que as petrolíferas e as empresas de gás estejam a fazer lucros recordes a partir da crise energética e graças às pessoas e comunidades mais pobres, com um custo enorme para o clima”. Foi um discurso violento e corajoso do secretário-geral das Nações Unidos, que no passado foi primeiro-ministro de um governo PS.

Vale a pena relembrar as palavras de Guterres: “Apelo a todos os governos que taxem este lucro excessivo e usem os fundos para apoiar as pessoas mais vulneráveis nestes tempos difíceis. E exorto as pessoas de todo o mundo a enviarem uma mensagem clara à indústria dos combustíveis fósseis e a todos os seus financiadores: esta ganância grotesca está a castigar as pessoas mais pobres e vulneráveis, enquanto destrói a nossa única casa”.

Em Portugal, pelos vistos ainda estamos à espera daquilo que o Expresso de sexta-feira chamava a “bomba atómica” que o Governo podia preparar – o executivo espanhol avançou há poucos dias com a “windfall tax”, os tais impostos sobre os lucros “caídos do céu”, mas Portugal ainda vai ter muito que esperar e é se chegar lá. Como sempre.

É verdade que o ministro da Economia, António Costa Silva, trouxe o assunto a debate em Abril, na discussão do Orçamento, mas teve rápida ordem para recuar. A 5 de Abril dizia: “Não podemos hostilizar as empresas, mas o que vamos fazer é falar com elas e provavelmente considerar um imposto, um ‘windfall tax’, para os lucros aleatórios e inesperados que estão a ter”. A 11 de Abril vinha a declaração de marcha-atrás: afinal, tratava-se de uma “solução última, caso venha a ser necessário”, mas com sorte não seria: “Se forem identificadas situações muito específicas, em que as empresas têm lucro normais da sua actividade que resultam da boa capacidade de gestão, dos investimentos produtivos e dos próprios lucros intensivos, vamos respeitar”. “

Rishi Sunak, o agora candidato a líder do Partido Conservador, já o fez quando era chanceler do Tesouro. Estamos a falar de Partido Conservador, na sua versão mais liberal – ou assim era, antes de a covid ter vindo baralhar as coisas - e não de neomarxistas. O imposto não é meigo: 25%. A taxa sobre os lucros excessivos das grandes empresas vai avançar aqui ao lado em Espanha, em Itália também, e nos Estados Unidos deve ser mais difícil embora não por falta de vontade de Joe Biden. Em Portugal parece estar ainda na infância.

Marcelo Rebelo de Sousa deixou uma porta aberta, curiosamente, quando disse que as empresas com lucros excessivos decorrentes da crise “não podem ignorar os que sofrem à sua volta. Têm de investir mais em termos sociais, sacrificando dividendos”, reconhecendo a dificuldade de “encontrar uma solução que não seja retroactiva, que seja justa” e que “abarque todos”. Resta esperar que acabe o imenso Agosto e que o Governo apresente as medidas de combate à inflação que prometeu. Aí se verá se Portugal é igual a qualquer outro “país europeu não marxista”.»

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1 comments:

Monteiro disse...

O que estamos à espera para para taxar os lucros caídos do céu? Que o Primeiro Ministro seja menos social democrata à portuguesa.