«O embuste mais sofisticado é o das pensões. No caso do IVA da energia, é somente uma rasteira contando com a ingenuidade das pessoas: “baixar dos 13% para os 6%” é uma afirmação rigorosa, embora esquecendo a explicação fundamental de que pouca da energia está abrangida pelos 13% e que, quanto ao resto, continuam os 23%, portanto pouco mudando na fatura final.
Mas no caso das pensões, que se dirige a mais de dois milhões de pessoas com os menores rendimentos e maior idade, a trapaça é ainda mais grave e consiste em dois passos: primeiro, oferecer em outubro um adiantamento do aumento legal previsto para 2023 e depois, a partir do início do próximo ano, reduzir o impacto do aumento que seria imposto por lei e, para esse efeito, mudar mesmo a lei.
O efeito dessa dupla manobra, além do engodo do pagamento em outubro, é manter no conjunto dos dois anos uma redução do valor real da pensão e, a partir de janeiro de 2024, diminuir a base de incidência dos futuros ajustamentos à inflação. Quem recebe uma pensão é prejudicado dessas duas formas e, portanto, se há uma medida estrutural, é esta: o valor efetivo da pensão vai cair em termos reais e ficará abaixo do que a lei impunha.
É uma velha obsessão do PS: no cálculo do seu programa eleitoral para 2015 anunciava orgulhosamente que, se Costa tivesse maioria absoluta, imporia o congelamento de pensões por quatro anos e as contas públicas ganhariam uns gordos 1660 milhões de euros. Essa medida teve de ser anulada graças à geringonça e houve aumentos, mas isso são contas de outro rosário.
Veja o caso da pensão média de velhice na Segurança Social, que, segundo os últimos dados oficiais, teria sido de 468 euros em 2020. Em 2021, com o aumento extraordinário e simplificando outros efeitos, andaria então pelos 478. Em 2022, essa pensão teve novo aumento extraordinário que, conjugado com o ajustamento legal, deu mais dez euros, a que agora, com o pacote ontem anunciado, se acresce a tal metade do mês de outubro. É sobre o valor base que se vão então aplicar os tais 4,43% do aumento para o ano de 2023, pelo que essa pensão chegará a partir de janeiro a 509,6 euros.
Se, em contrapartida, essas pensões tivessem sido atualizadas este ano pelos 8%, mesmo considerando uma inflação abaixo da real, e se no próximo ano se aplicasse a lei que imporia o aumento de 8%, o valor recebido pelos pensionistas ao longo dos dois anos – para não perderem poder de compra e na hipótese incerta de que a inflação em 2023 seja igual à deste – seria de mais 831 euros do que o que lhes entrará nas contas.
A diferença é mais de um mês e meio de pensão. Será menos se a inflação do próximo ano for menor, será maior se o contrário acontecer e, até agora, as previsões só pecaram por defeito. Ou seja, a medida do governo para as pensões é uma intrujice.»
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