«Alexandra Reis ingressou na TAP em setembro de 2017, foi nomeada administradora três anos depois e, com um salário de 17.500 euros por mês, recebeu, em fevereiro passado, ao fim de dois dos quatro anos de mandato, uma indemnização de 500 mil euros, por cessação antecipada do cargo de administradora executiva.
Estou à espera que a TAP desminta esta notícia ou, pelo menos, este valor. Não se trata de saber se a atual secretária de Estado do Tesouro tinha direito, pelas regras contratuais, a meio milhão de euros de indemnização depois de dois anos em funções. Muito menos se pode ir para o Governo. Não há, como é evidente, qualquer incompatibilidade.
Se a questão não é legal, também não é essencialmente ética. Até porque, pelo que sei, os trabalhadores que saíram da empresa receberam todos indemnização – em valores bem diferentes e com critérios diferentes, como é habitual. Do que também julgo saber, o valor que recebeu (que não sei se foi o tal meio milhão) até é inferior ao que contratualmente teria direito. A questão é, antes de tudo, e isso é o que realmente me interessa, política.
Se Alexandra Reis recebeu efetivamente 500 mil euros de indemnização será porque tem direito a ela. A dificuldade da TAP será explicar qualquer corte nos direitos dos seus trabalhadores. Sim, a ex-administradora recebe o remanescente do tempo que faltaria para o fim do mandato, não pela antiguidade, como os trabalhadores. Mas não me ocorre nenhum critério de proporcionalidade que permita explicar esta regra contratual. Podem explicar que ela está dentro da lei e é comum, o que é verdade. Mas perderam qualquer argumento moral para dizer aos trabalhadores que ao fazerem greves em momentos-chave para a empresa a estão a pôr em risco, depois dos contribuintes terem lá posto muito dinheiro, como costuma ser afirmado pelo ministro das Infraestruturas e a Administração. Também eles estão dentro da lei.
Quanto a Alexandra Reis, o facto de ter recebido uma indemnização legal (tão legal como os salários que critiquei aos administradores do Novo Banco) não lhe retira qualquer direito político. A questão é a que se põe a qualquer liderança: a autoridade política para exercer o cargo de forma eficaz. Terá dificuldade em estar num governo que peça sacrifícios aos trabalhadores, incluindo aos do Estado. Não é um pormenor, numa secretária de Estado do Tesouro.
Perguntarão: se há cumprimento do contrato – talvez até abaixo do contrato –, qual é o valor a partir do qual isto não seria um problema? O bom senso não tem uma fronteira clara. Posso dizer que, para mim, meio milhão é aviltante para qualquer indemnização que corresponda a tão poucos anos numa empresa. Que é absurdo dar-se a administradores todo o remanescente até ao fim do contrato quando isso seria impensável para um trabalhador. Que, pelo contrário, quem tem salários tão altos precisa de menor proteção contra o risco de desemprego do que outros.
Tudo isto são considerações discutíveis, porque são considerações políticas. E é por isso que, apesar da indemnização ser aviltante, de nada posso acusar a ex-administradora, a não ser de falta de bom senso e sensibilidade. E de ter julgado que isto não seria uma questão política quando fosse tratar das contas públicas, depois de ter saído de uma empresa que exigiu um enorme investimento do Estado.
Quando a secretária de Estado do Tesouro falar da prudência que enche a boca do ministro das Finanças todos os portugueses verão meio milhão na sua testa. Isto não chega como problema político? Para mim, que detesto ver este tipo de casos a tomarem conta do debate político, é. E até estou a fazer um esforço para ser suave perante a desagradável sensação de ver os abutres à volta da carcaça.»
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1 comments:
Já se demitiu a pedido.
Falta saber quanto pediu de indemnização!
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