11.2.23

Imigrantes do bem e do mal

 


Imigrantes do bem e do mal «No melindroso debate sobre a forma como Portugal acolhe os imigrantes, a linha que separa os discursos reguladores dos potencialmente xenófobos é ténue, na exata medida em que o tema só ascende à arena mediática quando somos confrontados com uma desgraça pública, o que normalmente se traduz num contraproducente esticar de posições.

E isso é o pior que pode acontecer: discutir a imigração em função de acontecimentos de que nos envergonhamos, como aqueles que ditaram a agressão bárbara a um cidadão nepalês no Algarve ou a morte de dois cidadãos indianos num incêndio no coração da capital. Portugal não tem um problema de imigração, ao contrário do que pretendem sugerir os pistoleiros do costume, que ligam esse chavão à criminalidade e à apropriação dos "nossos empregos", mas a elevada dependência do nosso país face à mão de obra estrangeira, no que isso também representa de novos fenómenos de aculturação, deve fazer-nos refletir sobre o quadro legal e humanitário em que estamos a acolher quem nos escolhe como casa, sobretudo nos grandes polos urbanos. Ainda que, é bom sublinhar, não deva ser esse o critério primordial para decidir sobre o acolhimento. Porque há quem apenas queira fugir da guerra, da pobreza ou de outros pesadelos. E esses, mesmo que não sejam "úteis" a preencher as vagas profissionais que os portugueses não querem, têm de continuar a merecer a nossa solidariedade.

Agitarmos a bandeira de país tolerante, progressista e fraterno pode certamente ajudar a adornar discursos para inglês ver, mas Portugal tem de ser consequente na aplicação dos princípios universais de acolhimento. Recebendo bem os imigrantes, não os explorando com salários miseráveis, fiscalizando aqueles que permitem que se amontoem em habitações indignas, apertando com aqueles que os trazem amarrados a redes escravas. Integração é isso. É normalizar, não discriminar. Por mais tentador e confortável que seja acreditar que há imigrantes do bem e imigrantes do mal.»

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