30.3.23

Acordo de cavalheiros: dá cá que logo se vê se dou

 


«Imaginem que Cláudia Azevedo ou Pedro Soares dos Santos assinavam um contrato com os produtores em que se comprometiam a reduzir-lhes um determinado encargo e em contrapartida estes se comprometiam a baixar os preços. Mas esse compromisso não tinha metas ou consequências em caso de incumprimento. Apenas um acordo de cavalheiros onde só um dos lados realmente estaria obrigado a cumprir a sua parte. O que fariam os acionistas? O que aconteceria às ações de uma empresa gerida de tal forma?

Pois foi isto que o primeiro-ministro assinou e, aparentemente, os acionistas, que somos nós, não estão aborrecidos. O compromisso das grandes superfícies fazerem refletir a descida do IVA no preço final não é apenas uma “fezada”. Pode nem sequer ser possível confirmar o seu cumprimento. Se os preços subirem nos próximos 15 dias até podem descer nos 15 dias seguintes sem refletirem a descida do IVA. Ou podem descer daqui a 15 dias e essa queda ser engolida por subidas posteriores ou por descidas que ficam por fazer apesar dos custos diminuírem. É absurda, porque são as grandes superfícies a controlar o preço, a composição desse preço, a manipulação ou não desses preços. Este acordo é vazio de conteúdo. Até o seu cumprimento é difícil de fiscalizar. O Estado tem uma quebra de receita de cerca de 410 milhões de euros à confiança.

Não me deito a adivinhar sobre os efeitos desta descida do IVA. O máximo que posso fazer é recordar o que aconteceu em Espanha, em que no segundo mês de vigência de medida semelhante (faltava-lhe o compromisso de honra) os alimentos subiram 16,6% face ao mesmo mês do ano passado, uma taxa superior aos 15,4% de janeiro e que ultrapassou o pico dos 15,7 % registado em dezembro. Ou o efeito nulo que teve a redução do ISP no preço do combustível - os defensores foram os mesmos, os que resolvem qualquer problema baixando impostos e depois nunca aqui estão para responder pela eficácia da medida. Ou a redução do IVA para a restauração. O que tem acontecido é que as empresas absorvem esse ganho. Não sei se se repetirá. Sei que não há qualquer garantia que assim não será, nem sequer que conseguiremos saber com toda a certeza se o fizeram ou não.

Estão, no entanto, de parabéns as carpideiras pelas grandes superfícies, empresas que vivem em oligopólio e há anos esmagam produtores e pequena concorrência, mas contam com exércitos de estranhos “liberais” para as defender. Era mais uns dias de debate e o Governo assinava um acordo para dar apoios públicos a estas empresas, ajudando-as a ultrapassar as notórias “dificuldades” por que passam, para assim poderem ajudar a baixar os preços. Suspeito que só por preconceito ideológico este governo marxista não o fez, aliás. Talvez venha a subsidiar as casas devolutas, para compensar.»

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