4.5.23

O maior aliado é o maior pesadelo

 


«“É o nosso maior aliado político, mas pode tornar-se o nosso maior pesadelo.” Quem o escreveu, referindo-se a Marcelo Rebelo de Sousa, a partir do âmago do Governo, foi Hugo Mendes, o secretário de Estado que António Costa teria demitido se tivesse conhecido este email, em quem ele aconselhava a CEO da TAP a alterar uma viagem para agradar ao Presidente da República.

António Costa não aceitou a demissão de João Galamba e, consequentemente, o aliado político de ontem será certamente um pesadelo recorrente de Costa para os próximos tempos. O primeiro-ministro achou que este era o momento para se separar de alguém que, vale a pena recordar, o PS deixou ser reeleito sem apresentar um candidato próprio às presidenciais.

Fê-lo como um gesto de afirmação da sua autoridade, com uma encenação que não deixa de ser lamentável, ao permitir que o seu ministro apresentasse uma demissão que não era para levar a sério, porque logo a seguir não seria aceite. Fê-lo para contrariar claramente Marcelo, cansado de tanto o ouvir falar de dissolução – o que objectivamente enfraquece o Governo –, mostrando alguma vontade de ir a jogo quando, neste mesmo fim-de-semana, deu notícia ao Expresso, através de fontes próximas, de que, se houvesse eleições antecipadas, o candidato do PS seria ele.

É pouco provável que Marcelo Rebelo de Sousa lhe faça a vontade. Os riscos são imensos. Desde logo, porque ele falou tanto de dissolução que seria sempre não só o autor material, como o autor moral dessa decisão. Para quem anda a pregar a necessidade de estabilidade, especialmente durante este ano, seria muito complicado explicar, mesmo com tanta trapalhada governamental, porque derrubava uma maioria absoluta eleita há pouco mais de um ano.

Mas mais trágico, na perspectiva presidencial, é a hipótese real de que do sufrágio saísse ou um PS vencedor (não restaria muito mais ao Presidente do que demitir-se de seguida), ou um PSD a precisar muito do apoio de um partido como o Chega, um ponto baixo na história do regime a que certamente um democrata como Marcelo não gostaria de ficar associado.

O Presidente tem tido, na maior parte dos momentos, uma atitude responsável e de necessária vigilância do Governo, quando a oposição, tão débil, não representa essa garantia de equilíbrio do sistema. É nessa linha que se espera que ele continue, mesmo que isso possa ser confundido com o célebre adágio de que a vingança se serve fria.»

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