«Portugal registou um surpreendente crescimento económico no primeiro trimestre, o que levou o circunspecto FMI a mais que duplicar a previsão de subida do PIB para 2023. Os salários aceleraram 7,4% também nesse trimestre, o que alimenta o sonho de uma economia capaz de sobreviver sem esmagar os custos de trabalho. A população activa aumentou 0,5% e são quase cinco milhões de portugueses a trabalhar.
Mas… há sempre um “mas” na economia. No último ano, os salários médios líquidos cresceram apenas um euro. Os contratos a termo subiram 7,7%. O desemprego disparou para os níveis da pandemia. A população jovem e qualificada foi particularmente afectada pela evolução negativa deste indicador.
Face a este cenário contraditório, é normal que o Governo sublinhe as coisas boas e que a oposição reafirme as coisas más. Convém, ainda assim, sair desse maniqueísmo para se tentar perceber o que nos dizem estes indicadores sobre o presente e o futuro. Cairemos assim, uma vez mais, nas questões essenciais: o país continua a falhar às novas gerações; o perfil de especialização da economia continua baixo; continuamos a exportar competências e talento e a acolher imigrantes com baixa qualificação.
Se, como já aqui escrevemos, há sinais na economia que sugerem mudança estrutural, há também constrangimentos e amarras ao anacronismo que revoltam e reclamam sentido de urgência. Não haver lugar no país para jovens qualificados é a outra face da moeda dos tuk-tuks ou dos empregados de mesa mal pagos e com contratos a prazo. Cavaco Silva dizia com sabedoria que, na política, a má moeda afasta a boa moeda. Na economia também é assim.
O país não escolhe, deixa andar. Olha sem critério para os sectores exportadores de classe mundial e para os sectores com baixo valor acrescentado. Depois do choque da pandemia, voltou a acreditar no milagre dos fundos europeus. Uma das maiores lacunas do Governo é a sua incapacidade de criar sentido de urgência na batalha pela economia.
É este caldo resignado que afasta os jovens qualificados, que tolera o salário mínimo, que trava o risco e a inovação, que prende a vanguarda da mudança. O aumento do desemprego dos jovens qualificados é um escândalo nacional. Ou talvez não: nas eleições, os pensionistas contam mais do que eles.
Talvez isso aconteça porque os indicadores não justificam o desespero. A notícia média passou a ser um problema. O “antes assim”, o “nunca pior”, o “ao menos isso” consolidam o fatalismo. Portugal, disse-o há anos António Costa, tem pela primeira vez na história a oportunidade de apanhar as carruagens da frente da nova revolução na economia. Por este andar, talvez as carruagens dos tuk-tuks.»
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