19.6.23

A escapadinha orbanista de António Costa

 


«A ida de António Costa à final da Liga Europa, na Hungria, fazendo escala na participação na II Cimeira da Comunidade Política Europeia, em Chisinau, Moldávia, tem três dimensões e as três são condenáveis.

A primeira é usar meios do Estado (o Falcon 50 da Força Aérea) para o que só poderia ter sido uma visita particular. Nem o Roma, nem o Sevilha são clubes portugueses e o apoio a um treinador ou um jogador português é um pretexto absurdo. O primeiro-ministro não faria outra coisa na vida se isso servisse de argumento para estar em jogos de futebol sem ser a título pessoal.

A segunda é esta escala não ter sido incluída na agenda oficial – e por isso só é notícia agora –, atentando contra a transparência do Estado. O facto de tal não ter acontecido demonstra, aliás, que o primeiro-ministro tinha plena consciência do absurdo desta escala.

A terceira é, por causa desta presença, o líder do governo português ter sido obrigado, como era previsível, a estar no camarote presidencial do Puskás Arena, em Budapeste, ao lado de Viktor Orbán. Há quem ache que era esse o desejo. Não me aventuro em conjeturas.

Fui dos que compreenderam a posição do primeiro-ministro quando, em rondas negociais para a distribuição de fundos europeus, defendeu que o respeito pelo Estado de Direito não podia ser critério na distribuição de dinheiro. A violação da democracia não se compra. Se a Europa assume que a Hungria não é uma democracia, deve expulsá-la da União. Não vai inventando critérios para distribuir recursos comuns. Hoje são estes, amanhã são os que derem mais jeito a quem parte e reparte e fica sempre com a melhor parte. Já há informalidade que chegue numa União que não respeita, ela própria, os princípios mais básicos das regras democráticas, como bem se recordam os gregos. Eu acho que a Hungria e a Polónia não preenchem as condições políticas para continuarem na UE. Mas, enquanto fizerem dela parte, são membros de pleno direito.

É natural que António Costa se encontre com todos os líderes europeus, mesmo com os mais detestáveis. As relações diplomáticas assim o exigem. Temos relações com os regimes saudita e chinês. Encontros diplomáticos não implicam proximidade política, como Paulo Portas pode explicar, quando se encontrou (e bem) com Nicolás Maduro.

Mas isto vale para encontros oficiais em que os Estados tratam dos seus interesses. Bem diferente é ver António Costa sentar-se ao lado de Viktor Orbán para assistir a um jogo de futebol em que o nosso país nem sequer está envolvido. Não sei se Costa foi a Budapeste porque lhe apetecia descomprimir da intensa vida política nacional ou para continuar a alimentar uma boa relação com a extrema-direita húngara pensando nas suas ambições europeias. Em qualquer dos casos, foi isso, ia às suas custas. Sei que, num e noutro caso, o Estado português não devia ter sido envolvido.

O primeiro-ministro merece censura, não merece os censores que andaram com Orbán ao colo enquanto ele violava todas as regras democráticas, convivendo com ele no seu próprio partido europeu. Mas é compreensível que a direita não perca a oportunidade de apontar a António Costa, que faz da falta de clareza do PSD em relação ao Chega o centro da estratégia política do PS, as suas próprias contradições. É o mesmo de sempre: quando não estão em causa os seus interesses, Costa não pensa para lá do momento.»

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