«O veredicto do presidente da República sobre o diploma da aceleração na progressão na carreira dos professores era a última grande decisão que se esperava antes da ida do país político a banhos. Marcelo Rebelo de Sousa já tinha feito saber que pedira esclarecimentos ao Executivo e decidiu anunciar que tinha devolvido o diploma sem promulgação ao Governo quando o primeiro-ministro estava num avião, a regressar de Timor. Para já, Governo e PS optaram por ficar em silêncio, mas é deles a palavra final.
O presidente da República enumerou um conjunto de problemas do diploma, desde logo o facto de na Madeira (onde governa o PSD) e nos Açores (aqui por iniciativa do anterior Governo PS, fez questão de lembrar) a contagem do tempo de serviço congelado estar a ser feita de forma faseada e gradual, o que considera ser uma “clara desigualdade de tratamento face aos professores do continente. Mas o texto em que justifica a não promulgação do diploma serviu, sobretudo, para apontar aquelas que, em seu entender, devem ser as prioridades da governação (por sinal, as que têm tido mais contestação): educação e saúde. Na sua justificação, o chefe de Estado desmonta um dos principais argumentos do Governo para não poder responder às exigências dos professores: o que isso iria significar em termos de acréscimo da despesa pública no futuro. Marcelo, o constitucionalista, alega que os estatutos das carreiras dos professores e dos profissionais de saúde não podem ser comparados com os de outras carreiras da administração pública, mesmo as especiais, deitando por terra um dos principais argumentos do Executivo. E diz que essas duas carreiras “deveriam ser prioridades se quisermos ir muito mais longe como sociedade desenvolvida e justa”.
A decisão tem sabor a vitória para os sindicatos, dando-lhes alento para pedir novas negociações e fazendo depender disso um arranque de ano letivo com mais paz nas escolas. Mas todos - até o presidente - sabem que o Governo tem a faca e o queijo na mão. É improvável que o Executivo decida reabrir um processo negocial que se prolongou por vários meses quando pode simplesmente levar o diploma ao Parlamento e confirmá-lo com a maioria absoluta de deputados de que dispõe. Se quiser agradar ao presidente, preocupado em dar esperança aos atuais e futuros professores, não será difícil contornar aquela que é a principal exigência de Marcelo: a ideia de que este processo não se encerra definitivamente agora e que, no futuro, com outras circunstâncias, será possível retomar a questão. Mas em maioria absoluta - como se viu no episódio da demissão de João Galamba -, a última palavra não é de Belém.»
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