31.8.23

Quando se confunde nação com raça

 


«1. Em 2012, Renaud Camus publicou “A grande substituição”, livro que, desde então, é uma referência da extrema-direita europeia. Aí defendeu que, nos países da Europa, a imigração, conjugada com a baixa natalidade, substituirá a população branca por africanos e árabes, assim se destruindo as culturas nacionais ocidentais e europeia. Ou seja, argumenta que só os brancos são verdadeiros europeus e só deles depende a sobrevivência das culturas europeias. A confusão entre cultura, nação e raça já tinha estado presente na ideia, de má memória, segundo a qual só os arianos eram verdadeiros alemães. Pouco de novo, portanto, nesta reedição da ideologia da racialização da identidade europeia.

Em 2023, em Portugal, há quem defenda (e não é o Chega) que existe o risco de uma “grande dissolução”, isto é, que em resultado da imigração “o povo português se transforme numa heterogénea multidão de um qualquer império global”. A heterogeneidade que fez grandes nações de imigração como os EUA, que não precisam de lições de patriotismo de ninguém, é, neste argumentário, convenientemente colocada debaixo do tapete.

2. A política de imigração do Governo não se tem deixado influenciar por estas vozes. Pelo contrário, se há área de intervenção política em que o país tem evoluído positivamente é esta. Com uma orientação humanista, cosmopolita e uma visão de futuro.

Portugal não é, de muitos pontos de vista, atrativo, tendo dificuldades em fixar imigrantes e portugueses. Porém, temos uma inegável vontade política de promover uma integração digna. Muitas vezes ficamos aquém, no plano da concretização, falhamos e somos confrontados com notícias de racismo ou xenofobia, exploração de trabalhadores imigrantes, condições de habitação inaceitáveis, que nos envergonham. Porém, há também exemplos notáveis: refiro, por exemplo, o trabalho do presidente da Câmara do Fundão e, com esta referência, reconheço o esforço de promoção de uma integração digna desenvolvido por governantes, autarcas, técnicos dos centros locais de apoio a migrantes, professores, profissionais de saúde e muitos outros. Os problemas da integração são difíceis, exigem recursos humanos qualificados, recursos financeiros e elevados níveis de motivação profissional. Há muitos portugueses que defendem e querem um país plural, que reconhecem a importância de acolher os que nos procuram e o quanto estes enriquecem o nosso país, cultura e identidade.

3. Felizmente, a tese da “grande dissolução” não tem hoje acolhimento por quem tem responsabilidades políticas na área da imigração nem está sentado no Tribunal Constitucional.»

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