«Agosto está a acabar como começou. Já se sabia que a pergunta fatal – “quem vai viabilizar o Orçamento do Estado do Governo” – seria uma interrogação para durar vários meses, depois da súbita mudança de posição do secretário-geral quando admitiu negociar o Orçamento, contrariando a sua posição inicial e dos seus principais dirigentes.
Com o Governo com desejos de desfazer o PS em bocadinhos e humilhar o partido de Mário Soares o mais que puder – como se tem visto nas declarações dos seus responsáveis –, negociar e viabilizar o Orçamento do Estado por medo de uma crise política que venha a favorecer o Governo e a prejudicar o PS é muito “poucochinho”.
É verdade que a estratégia de viabilização tem o apoio do antigo secretário-geral António Costa, que, do alto do seu cargo de presidente eleito do Conselho Europeu, aconselha o PS a fazer o que ele nunca faria na mesma situação. Mas as coisas mudam.
O risco de Pedro Nuno Santos “antoniojosesegurizar-se”, anulando as suas convicções políticas de sempre – quando está a ser muito mais maltratado pelo Governo do que António José Seguro no seu tempo foi por Passos –, é entrar já em território suicida.
Na verdade, ao recusar a oferta do PS para negociações, como se está a ver, o Governo acaba a fazer um favor político aos socialistas. Se o objectivo do avançar para negociações era mostrar que não seria o PS o culpado de uma crise política, o silêncio do Governo perante a oferta torna mais compreensível que o PS acabe a votar contra.
Não é só o PS que não quer eleições já. O Governo também não. Vai avançando com medidas para a reconciliação com os pensionistas, graças aos excedentes orçamentais dos governos PS, mas é difícil que, com a crise da Saúde a que assistimos este Verão – em nada diferente da que aconteceu no Verão passado –, a AD esteja em condições de ter um resultado muito mais expressivo do que aquele que obteve há um ano, a curto prazo.
Se é para repetir a táctica cavaquista do Governo de 1985, ainda é muito cedo – a maioria absoluta só chegou em Julho de 1987, por um erro estratégico do PRD e do PS, e quando uma imagem positiva de Cavaco Silva já estava consolidada no país.
Quando o Governo e o PSD dizem que não querem eleições já, devemos levá-los a sério. Também Montenegro precisa de tempo. E quando os dirigentes do PSD se referem ao PS da forma como o fazem, também os devemos levar a sério: não têm qualquer interesse em negociar seriamente com os socialistas o Orçamento do Estado.
Na entrevista que deu ao Expresso na última sexta-feira, o líder parlamentar do PSD Hugo Soares afirmava a quase obrigação de o PS viabilizar o Orçamento do Governo por “duas ordens de razões”, a primeira das quais era o facto de, segundo Hugo Soares, o PS ser “responsável pelo caos nacional a que o país chegou com os últimos oito anos de governação”. Obviamente, isto só significa que o PSD quer comer o PS de cebolada, obrigando-o – com uma eventual viabilização do Orçamento do Governo – a renegar os executivos Costa.
Quando alguém precisa de ajuda de um outro, não começa a conversa agredindo-o com duas estaladas. O Governo anda à estalada ao PS porque sabe perfeitamente que é o seu inimigo político principal e mais forte – e a quem politicamente interesse humilhar e reduzir à mínima expressão. Conta com o medo que os socialistas têm de uma crise política e com a pressão dos autarcas para obrigar o PS a ceder e a ficar comprometido com o Orçamento.
Mas, a meio deste Agosto, Pedro Nuno Santos deu uma espécie de “grito de alma” em que abriu espaço para o voto contra, num retorno à posição inicial, e que contraria a ideia que se está a popularizar de que o PS viabiliza o Orçamento. Foi a 15 de Agosto, quando afirmou “não chateiem o PS”, lembrando que a direita ganhou e que o PS está na oposição, colocado “sob uma pressão que não é aceitável”.
A direita é maioritária no Parlamento. Por muitas tropelias que André Ventura arranje, o Chega é quem tem mais a perder com eleições. Assim como fez nos Açores e na Madeira, tratará de inventar uma vitória qualquer para justificar o voto a favor e não ser o culpado por retirar a direita do poder. Temos mais dois meses e meio de suspense – mas o que tem de ser tem muita força.»
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