17.9.24

Continuamos a ser um país frágil

 


«Passámos o Verão receosos de que um dia como o de ontem pudesse chegar. E foi logo pela manhã, na primeira reunião de redacção, que, por vários sinais, percebemos que esta segunda-feira iria contrariar o registo que fazia com que, até 31 de Agosto, este fosse o ano com menor área ardida da última década. Infelizmente, como sublinhava ontem António Nunes, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, “as contas fazem-se no fim”. E o fim ainda não foi ontem.

Calor, vento, casas a arder, diferentes frentes de incêndio, numa região onde habitação e floresta se misturam, eram sinais mais do que óbvios para ficarmos em alerta e enviarmos para o terreno os meios que nos permitissem uma cobertura aproximada do que estava a acontecer. O céu alaranjado no Porto, as cinzas que começavam a cair longe do epicentro dos acontecimentos, era a confirmação do dia de angústia que se seguiria, com um país cortado ao meio pela dimensão dos incêndios que, na hora em que se escreve este editorial, estão longe de estar terminados.

Como continuarão muito longe os dias em que poderemos passar um Verão sem sobressaltos, porque este é um país frágil, sempre que a questão é ir ao âmago dos problemas. É isso que explica no nosso podcast P24 o ex-secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural Miguel João de Freitas, que entre 2016 e 2017 co-assinou um conjunto de diplomas que ficaram a ser conhecidos como a Reforma da Floresta. Desde aí, afirma, foi feito muito trabalho em matéria de meios de combate ao fogo, foi feito muito trabalho na prevenção, mas “ficou por cumprir aquilo que era essencial, a gestão florestal”. E sublinha: “Se não tivermos um território que esteja gerido, a qualquer altura podemos voltar a ter fogos da dimensão dos de 2017.”

Depois da tragédia de Pedrógão, estávamos obrigados a fazer melhor, mas estamos ainda muito longe de resolver um problema que o aquecimento global só veio agravar. Enquanto não conseguirmos que a gestão do território seja um desígnio nacional, vamos estar sempre aquém do que é necessário para que não aconteçam dias como o 16 de Setembro de 2024.

Que pelo menos este dia, marcado já pelos enormes prejuízos materiais e pela perda de vidas humanas, sirva como impulso para olhar para os programas que já existem e que precisam é de força política e de dinheiro para serem realidade no terreno. Sem isso, sem um Governo que assuma a centralidade desta prioridade, continuamos a ser um país frágil, à mercê de uma rabanada de vento que desperte novamente o inferno.


1 comments:

Fenix disse...

"...mas “ficou por cumprir aquilo que era essencial, a gestão florestal”..."

Gestão florestal ou, melhor dizendo, gestão do enorme eucaliptal em que Portugal se transformou...

É chamar para a resolução do problema aqueles responsáveis políticos, que utilizaram as portas giratórias entre os governos e a presidência das empresas de celulose. Há quem já tenha feito uma lista exaustiva com esses nomes, mas nas "tertúlias" das Tvs só se fala dos meios de combate aos incêndios, que são escassos, das limpezas das matas e pouco mais.