3.9.24

Muito menos do que humanas

 

Ebrahim Noroozi/AP

«Horia Mosadiq, jornalista e ativista afegã, desfia memórias que hoje parecem devaneios impossíveis. “Em miúda, lembro-me da minha mãe a vestir minissaias e a levar-nos ao cinema.” Esse tempo e as imagens de um Afeganistão que não foi sempre sombrio são o mais óbvio desmentido dos argumentos do regime talibã, que não apenas impôs um total apagamento das mulheres nas mais recentes leis de vício e virtude, como tentou criticar as reações externas.

Zabihullah Mujahid, o principal porta-voz do governo talibã, diz haver “arrogância” e desconhecimento da lei islâmica. Além de não haver direito à “compreensão” da comunidade internacional perante graves atentados a direitos humanos, o que está a ser aplicado não encontra respaldo no islamismo, como o comprova a história do próprio Afeganistão e de outros países islâmicos. Assiste-se a uma supressão total de 14 milhões de mulheres e meninas e a uma afirmação de ódio pela figura feminina.

Nos três anos desde que tomou o poder, o regime já tinha excluído as mulheres de quase toda a vida pública, impedindo a frequência do ensino médio, o emprego remunerado ou o simples ato de ir a um salão de beleza. Estava-lhes igualmente vedado o acesso ao sistema de justiça e foi assumida uma aplicação discricionária de punições, incluindo a normalização do apedrejamento. Agora até a voz é proibida, mesmo em circunstâncias em que seja audível a partir do interior de uma casa.

A reação da comunidade internacional é demasiado tímida, quase limitada à posição das Nações Unidas e aos alertas das associações de defesa dos direitos humanos. O que se passa no Afeganistão é demasiado monstruoso e não é um problema de mulheres. É um ataque a todos os seres humanos. Uma negação do direito a existir. Uma obsessiva intervenção para tornar menos do que humana metade da população do Afeganistão.»


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