«Pensa-se no Natal e há imagens que associamos imediatamente à quadra. O bacalhau na noite de Consoada, o peru no almoço de Natal, o velho bolo-rei num cantinho da mesa, quase esquecido perante outros doces ainda mais gulosos que se partilham por estes dias. Também já faz parte do quadro festivo aquela enésima exibição do Sozinho em Casa a competir, no ecrã da TV, com as performances dos artistas de circo pela atenção dos portugueses. Nos últimos anos, há uma outra imagem que começa a ganhar esses contornos de clássico natalício: as montanhas de lixo nas ruas de Lisboa devido às greves dos trabalhadores da Higiene Urbana.
Este ano não foi exceção. O DN testemunhou logo os primeiros sinais do problema no Dia de Natal, numa viagem pelos bairros de Alvalade, Graça, Lumiar, Telheiras e Areeiro, bem como as queixas dos moradores e um certo conformismo com a situação: “Todos os anos é assim”. No dia seguinte, a situação agravou-se e a reportagem da agência Lusa até notou que, apesar de não existirem sinais de “tempestade no mar” (como diz o ditado popular), havia muitas “gaivotas em terra”, que aproveitavam o lixo disperso para se alimentar e, também elas, terem direito a um Natal mais abundante.
Mas o problema do lixo nem sequer é novo ou um exclusivo da quadra de Natal, pois já em setembro o PS viu nesta questão uma alavanca para propaganda política contra o autarca da capital, espalhando cartazes pela cidade com a palavra Moedas, onde o O era uma composição fotográfica de caixotes do lixo a abarrotar. Como se os socialistas, quando estiveram à frente da câmara, tivessem conseguido uma solução definitiva para o tema. Certo é que os ‘Novos Tempos’ que Moedas prometia para Lisboa também não trouxeram solução para a falta de profissionais e quantidade de viaturas inoperacionais.
Os trabalhadores da Higiene Urbana são vitais para o bem-estar da cidade. Mas inaugurações, renovações, requalificações e outras palavras que rimam com milhões (de euros) são muito mais apelativas para quem lidera, pois geram títulos positivos nos jornais e passam uma imagem de ação, de obra feita ou projetada, que rende votos. Infelizmente, esta é uma realidade que grassa por todo o lado. Promete-se apostar em novos rumos, novas soluções e investimentos, enquanto se ignoram os problemas de quem faz a máquina funcionar. Como se fosse um dado adquirido que, mais cedo ou mais tarde, se vão calar e sujeitar ao que já existe. As pessoas não são um papel que se amarrota e se coloca num caixote à espera que se reciclem. Tratar atempadamente de soluções justas para os seus problemas devia estar no topo das prioridades, até para evitar outro clássico português: ser preciso uma crise para se discutirem soluções. O lixo é um bom exemplo deste sistema que se perpetua e ignora um princípio básico: tratar primeiro do essencial para depois abraçar o futuro com maior segurança.»
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