21.1.25

Os super-ricos são os novos donos disto tudo

 


«Os homens mais ricos dos EUA tomaram posse do país. Nunca uma administração teve tantos multimilionários, nunca os homens mais ricos do mundo prestaram tanta vassalagem a um presidente eleito e nunca foram tão perigosos.

Há muito em comum entre todos eles. Donald Trump escolheu quem escolheu porque financiaram a sua campanha, defenderam as ideias mais absurdas na Fox TV ou partilharam o mesmo ódio pela defesa de princípios como os da diversidade, equidade ou inclusão.

Embora o vocabulário do MAGA (Make America Great Again) se cinja às palavras meritocracia e tarifa, estas escolhas não foram feitas em função do mérito ou do conhecimento, mas sim em função da conta bancária e da fidelidade.

Donald Trump partilha várias crenças com os seus escolhidos, a começar pela regra simples de que tudo se vende e tudo se compra, o que tanto é válido para a ética e a dignidade como para o silêncio de uma actriz porno ou para a Gronelândia.

A imposição do dinheiro e da força como método de diplomacia, juntando fortunas e capacidade militar altamente destrutiva, tanto faz lembrar a compra do Alasca e o regresso ao expansionismo do século XIX como nos faz crer que esta será a ordem internacional que se segue a partir de hoje.

O regresso a uma ordem internacional deste tipo é o oposto do ordenamento internacional criado e exportado pelos EUA desde o final da Segunda Guerra Mundial, legitima a invasão russa da Ucrânia, a hipotética invasão chinesa de Taiwan ou qualquer outro desejo de expansão territorial, seja de quem for, com legitimidade ou não.

Donald Trump é um soberanista que só respeita a sua própria soberania, que não quer saber de mais ninguém, a não ser de si próprio e daqueles que concordam com ele, que não reconhece aliados e que aprecia mais autocratas do que democratas. O direito internacional vai ser interrompido por momentos.

O discurso da superioridade dos valores e da democracia (que justificaram até aqui o estatuto dos EUA no mundo e que caucionaram muitas das suas intervenções militares) vai ser substituído pela prática da política enquanto negócio sob coacção. A credibilidade ocidental, tão deteriorada com a hipocrisia dos dois pesos e duas medidas, em Gaza e na Ucrânia, está, definitivamente, comprometida.

Acresce que esta não é apenas a coligação dos super-ricos. É a coligação dos super-ricos da extrema-direita mais radical e perigosa, que negam a evidência das alterações climáticas, recusam a vacinação e o conhecimento científico, defendem a supremacia branca e masculina, censuram um ensino humanista e inclusivo ou ficam embevecidos sempre que escutam a palavra deportação. Não consta que morram de amores pela democracia, ou não a tivessem tentado derrubar há quatro anos.

Esta coligação estará disposta a exportar a receita boçal e regressiva, e não falta na Europa quem esteja disponível para a receber de braços abertos, mesmo que isso implique uma ingerência inaceitável nos assuntos dos seus estados.

Para a oligarquia que vai tomar conta dos EUA, uma expressão que estamos habituados a associar ao chamado terceiro mundo, não há qualquer conflito de interesse em apropriar-se do Estado para aumentar os lucros.

Este assalto ao Estado é mais eficaz do que o assalto da turba ao congresso. O aviso de Joe Biden quanto aos riscos da ausência de escrutínio e do impacto que esta oligarquia pode ter na ameaça à democracia dos EUA é um perigo real, mas o que tem preocupado a população é a deportação de imigrantes indocumentados e com antecedentes criminais.

Numa conjuntura de perda de influência do jornalismo, e da sua substituição por canais de distribuição de conteúdo mais desinformativos do que informativos, a menor relevância do escrutínio será um facto consumado. No primeiro mandato de Trump, a imprensa dos EUA resistiu e fortaleceu o seu papel. As instituições não cederam.

Neste segundo mandato, Trump concentra todo o poder, pelo menos até às eleições intercalares de 2026, e tem a seu lado os super-ricos que mandam no que vemos, lemos ou ouvimos. Nenhum deles tem qualquer compromisso com a liberdade de expressão, moderação ou pluralismo, expressões do século XX. Aquilo a que Elon Musk e Mark Zuckerberg chamam liberdade de expressão mais não é do que a ausência de qualquer cuidado ou responsabilidade pelas mentiras que irão propagar de forma deliberada.

Desta vez, Trump já sabe que nenhuma rede social irá suspender as suas contas, diga o que disser. A associação entre este presidente e esta espécie de quinto poder, sem regulação, vai exigir uma prova de vida do sistema democrático e uma prova de cidadania de cada um de nós. Contra os factos, haverá sempre uma mentira. E os super-ricos encarregar-se-ão de lhe garantir mais alcance.»


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