14.5.25

A marcelização de quase todos os partidos

 


«Quando, nas autárquicas de 1989, o candidato do PSD a Lisboa Marcelo Rebelo de Sousa decidiu dar um mergulho no Tejo e guiar um táxi pelas ruas da capital, caiu o Carmo e a Trindade.

Marcelo era “o Marcelo”. Por essa altura, já se sabia que “o Marcelo” era diferente de todos os outros políticos e estava sempre disposto às mais variadas maluqueiras. Marcelo é totalmente genuíno, sempre foi assim. Levou a sua personalidade para o cargo de Presidente da República, tornou-se “o Presidente do povo” – apesar dos dias piores – e mostrou abundantemente o seu peito desnudo nas televisões.

Esta campanha para as legislativas, talvez uma das mais desinteressantes de sempre, está a assistir à marcelização de quase todos os protagonistas. Já conhecemos o peito nu de Montenegro numa tarde de campanha eleitoral, e a capacidade de andar de mota de Pedro Nuno Santos. Entretanto, assistindo ao programa de Guilherme Geirinhas, ficámos a saber que Montenegro não pinta o cabelo, fez dieta, gosta de dormir com cortinas cerradas e acha que se o seu filho é bonito é porque “saiu ao pai”.

Pelo que já se sabe da antevisão do programa de Geirinhas, que vai nesta terça-feira para o ar, Pedro Nuno Santos já foi barrado numa discoteca e também tem capacidades de dar saltinhos ligeiramente ridículos lado a lado com o humorista.

O “engraçadismo” tomou conta desta campanha, muito mais do que a política. Os líderes dos principais partidos estiveram mais disponíveis para dar entrevistas a todos os programas de entretenimento e a todos os programas de humor e limitaram ao máximo as entrevistas à imprensa. Como aqui escreveu David Pontes, estiveram mais disponíveis para os humoristas do que para os jornalistas.

Mas a disputa sobre qual será o “candidato mais cool”, como escreveu Daniel Oliveira no Expresso, não se restringiu aos líderes dos mais votados. Para meu espanto, abri esta manhã o Instagram e vi Francisco Louçã, que sempre foi um institucional à sua maneira, a fazer um salto livre de cinco mil metros. Fiquei logo com vertigens. É verdade que Louçã estava a responder ao Chega que, com a educação habitual, o acusou de fazer a campanha de “bengala”, como se isso fosse um problema (era, no caso, preconceito idadista).

Temo pelas eleições do próximo ano: a tendência vai agravar-se.»


0 comments: