21.5.25

Todos, todos, todos? Montenegro não é o Papa, que escolha!

 


«Todos os putativos candidatos à liderança do PS, em circunstâncias muitíssimo difíceis para o partido, defendem um acordo de viabilização do governo de Montenegro e do seu segundo orçamento. Independentemente da opinião que eu tenha sobre isto, Montenegro não tem, desta vez, de que se queixar. Assim, o Presidente da República deveria usar o pouco poder que de influência que lhe resta para impedir que, havendo condições políticas para uma solução estável, ela seja recusada por quem tem o dever de a apresentar.

Isto quer dizer que Marcelo não deve aceitar, sem uma reação ativa, o que foi anunciado pelas principais figuras da AD: que não negoceia com ninguém, apenas o fará medida a medida. Como já se percebeu, esta estratégia tem como objetivo vir a penalizar o Partido Socialista, mantendo-o fora do círculo de poder sem o deixar fazer oposição. Em vez de um interlocutor estável, que resulta de uma negociação clara, tem um refém, sujeito à sua arbitrariedade. E aproveita a ausência de liderança socialista para continuar a brincar com o fogo. Uma brincadeira que nos ofereceu o começo da destruição do nosso sistema partidário democrático.

Deste ponto de vista, e se o PS acha inevitável apoiar este governo, faz mais sentido a linha de Fernando Medina, que impõe condições para isso – não integração da IL no governo; o interlocutor ser, de forma permanente, o PS; e um compromisso de combate à progressão do Chega –, do que a disponibilidade incondicional de José Luís Carneiro. A escolha é o PS fazer-se de morto ou assinar já a certidão de óbito. Mas isso é com o PS.

Deixo para amanhã o preço que será pago pelos socialistas se se transformarem em base de apoio, mesmo que informal, deste governo. Será um erro histórico (a direita tem maioria e está na altura de assumi-la), mas o PS parece estar disposto a pagar esse preço e talvez não tenha espaço para outra coisa. Seja como for, se há dois partidos disponíveis para negociar, deve ser forçada a negociação. A AD tem de fazer escolhas. Se não escolher, o Presidente, que tem pouco poder para forçar seja o que for, deve prolongar a negociação até que fique claro, para memória futura, quem deseja manter as condições para a instabilidade. Mas os sinais que dá são, como há um ano, de uma enorme pressa para atamancar uma solução instável.

A AD não pode ter dois cordões sanitários, em que fala com dois mas não se compromete com nenhum. Ou fala com o Chega, ou fala com o PS. Montenegro não é o Papa, que recebe todos, todos, todos. É um primeiro-ministro com o dever de governar no quadro eleitoral que lhe foi dado pelos eleitores, pela segunda vez num ano. Porque não é o PS que fica refém. É o País. Por isso, o Presidente não se deve manter passivo se a AD, aproveitando um vazio de poder no PS, quiser manter o pântano, para ver se destrói todos os concorrentes neste processo. Já basta o que Costa fez ao resto da esquerda.

Com a vitória eleitoral, o óbvio parece ter sido esquecido: Luís Montenegro usou as suspeitas sobre o seu comportamento ético (que os votos não apagaram, nem apagarão) para criar uma crise e tentar conquistar uma maioria com a IL. Apesar do crescimento, ficou a léguas disso. O seu reforço “muito significativo” corresponde ao pior resultado de sempre numa reeleição de um primeiro-ministro.

Montenegro deve assumir a vitória, respeitando, na sua plenitude, a vontade dos portugueses. E os portugueses decidiram, pela segunda vez, não lhe dar maioria para governar sem precisar de outros. Respeitar os resultados é respeitar os eleitores que votaram no PS e no Chega, quase 1,4 milhões em cada um.

Todos os cenários, seja o acordo com o Chega ou com o PS, são péssimos. Repetir o anterior é impensável. Sobretudo quando há interlocutores para assim não ser. Luís Montenegro não pode continuar a querer ficar com o bolo enquanto o come.»


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