12.6.25

Combater o reagrupamento familiar, impedir a integração e alimentar o conflito

 


«Nem vou perder tempo com mais mentiras de Ventura, que fala na breve chegada de meio milhão de imigrantes por via do reagrupamento familiar. Remeto para os trabalhos do “Diário de Notícias”, em que as coisas ficam devidamente esclarecidas: nem o reagrupamento é automático, havendo critérios bastante apertados, nem os números se aproximam do que foi dito. Recordando que a ligeireza da comunicação social foi veículo, ainda antes de a extrema-direita lançar uma petição, para espalhar esta ideia.

Mas é muito interessante verificar o cinismo dos que passam o tempo a dizer que não são contra a imigração, desde que haja condições para integrar, e, depois, abrem guerra ao mais poderoso instrumento de integração em qualquer comunidade. Assim como é curioso que conservadores, que defendem que a família é o pilar da sociedade, finjam não perceber que, se assim é, ela é o pilar de qualquer integração social.

Há uns dois anos, um autarca de um concelho de forte imigração para trabalho em estufas e agricultura intensiva explicava-me que a grande prioridade era mesmo o reagrupamento familiar. Com os filhos nas escolas e as mulheres integradas na sociedade, em vez de grupos de homens sem família a vaguear pela rua nas horas de lazer, tudo seria mais simples.

É natural que o Chega não queira a integração dos imigrantes. A extrema-direita vive do conflito. E o conflito, existindo sempre, é mais difícil quando o filho do imigrante é colega do nosso filho. Quando as comunidades se cruzam.

Sabemos que um dos fatores para os preços proibitivos das novas casas é o custo de construção, por falta de mão-de-obra. Não é por falta de mão-de-obra barata. É mesmo por falta de quem trabalhe no setor. Se a isso juntarmos a nossa penosa crise demográfica, confirmamos que precisamos de imigrantes. A questão é se preferimos a imigração desintegrada (é essa que a “via verde” criada pelo governo, a pensar em grandes empreitadas, favorece), ou se, como todas as nações prósperas e desenvolvidas, queremos viver em sociedades cosmopolitas, com uma imigração integrada que crie as suas raízes. Os fluxos migratórios vão continuar a aumentar. A questão é como gerimos esse processo inevitável.

Há uma linha liberal, a que alguma esquerda adere, que acha possível lidar com esta realidade sem regulação. Sou dos que acreditam numa regulação razoável para quase tudo. Nisto ou no mercado. Curiosamente, a direita liberal, que se aproxima cada vez mais da extrema-direita no debate sobre a imigração (a imigração ilegal tem vantagens económicas), acha que esta razoabilidade passa a ser “protecionismo” quando chegamos aos fluxos financeiros ou comerciais. E há outra esquerda que pensa poder saltar sobre este debate, para não contrariar o sentimento popular. É impossível. Porque, com as alterações climáticas, os desequilíbrios demográficos e um mundo onde tudo parece estar mais próximo, este será o tema das próximas décadas.

Se este vai ser o debate, é bom não entrar nele com os termos da extrema-direita. Porque a sua proposta de encerramento de portas vai muito para lá da imigração. A questão ultrapassa os nossos deveres morais e humanistas. Além de a sua visão étnica da nacionalidade acabar sempre com a exclusão de minorias nacionais, a imigração é o pretexto para a destruição da própria democracia. Basta olhar para o que se passa na Califórnia para perceber porque é que os autoritários apostam neste filão. Sabem que lhes oferece os argumentos para imporem um estado de excepção e para fragilizarem todos os limites ao seu poder. Não querem apenas fechar as portas a quem entra. Querem trancar-nos no seu mundo de medo e violência.

Nota: deixo o que aconteceu no Teatro “A Barraca” e no dia 10 de junho para a semana. Quero perceber se aqueles que normalizaram o discurso de ódio perceberam que fantasmas estão a deixaram à solta ou se viram isto como mais um episódio mediático.»


1 comments:

Albino Manuel disse...

A questão das restrições à imigração não é exclusiva da extrema-direita, embora seja um cavalo de batalha desta. É só olhar para França ou para a Alemanha.

Em todo o caso, percebe-se a linha de pensamento do Bloco de Esquerda e de Daniel Oliveira. Tem apenas um senão: perderam à grande e à francesa as eleições.

Presumo que o próximo passo seja a oposição extraparlamentar, quer dizer, manifs e manifestos. Nisso o Bloco é perito. Num dia A aparece como militante, no outro como activista. Se tiverem sorte...já o governo espera-se que dê execução ao seu programa. Foi para isso que foi eleito.