«Neste novo ciclo político, antes mesmo de arrancar oficialmente com a posse dos deputados no Parlamento, já há cartas marcadas à vista de todos. Num regime com um sistema político semi-presidencialista, mas de grande pendor parlamentar, a mudança de Chefe de Estado é um factor de grande importância, mas o ás de trunfo é sempre o chefe do governo. Mais do que decidir manter a estratégia de negociar à direita e à esquerda, obrigando as diferentes bancadas a assistirem quando o governo vai a jogo com os naipes das oposições, Montenegro entrou a destrunfar as direitas, pondo um ponto final na revisão constitucional com que IL e Chega pretendiam lançar fogo de artifício para entreter os seus eleitores. Era impossível ao líder da AD ter arrancado melhor.
À direita, André Ventura tem passado os dias ao espelho a contemplar a magnificência, enquanto Rui Rocha descobriu que o que era grande era a sombra projectada de uma ambição desmedida. À esquerda, o Livre sofre do mesmo que a IL, pela vitória que não esconde a irrelevância, enquanto o Bloco o mais que consegue é ter o tamanho do PAN e do JPP, deixando para o PCP, que um dia já teve 47 deputados, a ideia de que se saiu bem com uma bancada de três.
Cereja no topo do bolo, a autofagia socialista procura salvar as autárquicas não cuidando de garantir músculo para não morrer na memória dos portugueses. Um partido que governou mais de metade do tempo da democracia, a quem os portugueses entregaram uma maioria absoluta há apenas três anos, que cuspiu no prato em que comeu desbaratando essa maioria, não pode fazer de conta que é só mudar de líder e vai ficar tudo bem. O PS tinha que estar a partir pedra à procura de aprender a falar de novo com os portugueses, mas prefere ficar nos seus jogos palacianos, hipocritamente sugerindo que é o melhor para o partido. Depois de um trambolhão de dimensões épicas, os socialistas ainda acham que o tempo cura tudo.»
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