«Por altura da celebração do Dia de Portugal registou-se em poucos dias um número pouco habitual de crimes de ódio e violência associados a neonazis, o que se passou no contexto de um aumento de 200% deste tipo de criminalidade nos últimos cinco anos. É tão absurdo que isto esteja a acontecer em Portugal que custa acreditar que jovens e menos jovens tenham perdido a vergonha de fazer a saudação nazi, manifestando-se através de agressões verbais e físicas a imigrantes ou pessoas de esquerda, sem sequer pensarem que o que estão a fazer pode constituir crime.
É de supor, por isso, que só a ignorância, a maldade e falta de vergonha ou o exibicionismo pode levar alguém a fazer a saudação nazi ou ter comportamentos violentos contra imigrantes, contra a cultura, contra a esquerda ou contra as instituições democráticas, inspirando-se na ideologia a que Adolf Hitler deu corpo e que ficou como uma mancha na história da humanidade, pela sua crueldade e barbárie. É preciso nunca esquecer que foi acima de tudo com a esquerda que se derrubou a ditadura e instaurou a democracia em Portugal.
Os assumidos neonazis domésticos saberão, ou se calhar não, que na Segunda Guerra Mundial terão morrido entre 70 e 85 milhões de pessoas, entre os quais cerca de seis milhões de judeus que foram enviados pelos nazis para as câmaras de gás ou fuzilados em massa ou foram vítimas de outros métodos cruéis, como a privação pela fome e por falta de assistência médica.
Assistimos a uma alarmante banalização e normalização dos movimentos extremistas, que têm proliferado com alguma impunidade, quiçá devido a simpatias ocultas por parte de alguns membros das forças de segurança, o que poderá talvez explicar que certas manifestações públicas de ódio não tenham quaisquer consequências criminais.
Foi mesmo desmontado um grupo com inspiração nazi que faz soar todos os sinais de alarme, com o infeliz acrónimo MAL, que significa Movimento Armilar Lusitano, indiciado por atividades terroristas, em que foram descobertos membros da PSP, da GNR e da Marinha, um considerável arsenal de armas e várias centenas de militantes, a quem seria fornecido apoio logístico e treino militar para causar perturbação pública. Entre as ideias subversivas estaria a intenção de fazer um assalto ao Parlamento e ao Palácio de Belém e derrubar o regime democrático, o que é arrepiante.
Mas nada disto é propriamente novidade, visto que se trata de uma reprodução de outros atos extremistas, como os que estavam em preparação pelo grupo autodenominado Reino da Alemanha, ligado ao movimento Cidadãos do Reich, que preparavam o derrube da democracia alemã. Na Alemanha, foram desmanteladas nos últimos anos várias células terroristas associadas à extrema-direita que manifestam claramente a sua vontade de derrubar o regime democrático liberal, onde foram identificados elementos pertencentes às forças de segurança. E a inspiração para o assalto ao Parlamento certamente viria da invasão do Capitólio impulsionada por Donald Trump em 6 de janeiro de 2021 e, dois anos depois, à Praça dos Três Poderes, em Brasília, pelos apoiantes de Jair Bolsonaro.
Portanto, a pergunta é simples. Visto que André Ventura anda a apregoar o fim desta República, ainda não se percebeu para instaurar o quê, é legítimo que nos interroguemos sobre o conhecimento, proximidade e envolvimento que possam ter militantes do Chega com as correntes que têm como objetivo subverter a ordem democrática, como o MAL, o 1143 ou o Ergue-te, entre outras. Não deixa de ser curioso que, numa altura em que as investigações ao MAL prosseguem com visibilidade pública, o líder do Chega ameace com uma comissão parlamentar de inquérito sobre… a chegada de imigrantes a Portugal.
E como é possível tantos jovens deixarem-se instrumentalizar pelo Chega e por outros movimentos extremistas, sabendo que, mais tarde ou mais cedo, muito provavelmente poderão estar perante a justiça, porque o que estão a fazer infringe a lei e a Constituição?»
1 comments:
... e o "sacro" Tribunal Constitucional que dá luz verde à legalização de partidos com esta gente?! Não tem escrutínio?!
Quanto à lei que "ainda" pode punir estes crimes de ódio, pelo rumo dos acontecimentos, é só uma questão de tempo e tudo é normalizado. Tal como o Direito Internacional fragilizado que nada pode, para suster a barbárie a que assistimos impotentes...
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