17.8.25

Não houve fogo no Pontal

 


«Se a ocasião era de ouro para marcar a agenda política, como Luís Montenegro o fez em outros anos, o Pontal de 2025 fica para história como o de um primeiro-ministro estranhamente a jogar à defesa em início de mandato. O arranque não está isento de problemas, mas o executivo lançou iniciativas e seria uma boa ocasião para afirmar a sua validade. Mas o que se teve foi um Montenegro minimalista e acossado.

Não é negligenciável que o Pontal tenha sucedido num momento de extrema gravidade na gestão dos incêndios florestais. O fogo que faltou no Pontal sobrava no país e o primeiro-ministro acusou o toque dos ecrãs divididos entre a tragédia e a festa social-democrata. Por muito que as alterações climáticas e a situação meteorológica sejam justificações, Montenegro sabe bem que esta é uma daquelas alturas em que o país avalia a capacidade do Estado estar presente junto de quem precisa. A avaliação não é satisfatória e a estratégia do silêncio, para não fixar a imagem de um Governo impotente, é contenção de danos, como o é o anunciado cancelamento das férias do primeiro-ministro.

Montenegro também não está a gostar do tom crítico em relação às iniciativas legislativas em torno das medidas de restrição da imigração. Voltou a visar a comunicação social no discurso, reafirmou a legitimidade eleitoral das suas iniciativas e deu uma no cravo e outra na ferradura em relação a Tribunal Constitucional. Foi tudo “normal”, mas não quer acreditar que os juízes possam “fazer um juízo político quando a sua função é fazer um juízo jurídico”.

Uma crítica dentro do “normal”, que não deixou antever qual vai ser o caminho do Governo para aprovar a legislação, o que poderia ter dado um motivo de interesse ao Pontal. Da mesma forma, também não acrescentou nada nos dossiês que mais incomodam os portugueses, a saúde e a habitação.

E foi de contenção de danos que o líder do PSD se ocupou, ainda que indirectamente, numa parte significativa do discurso, com o anúncio de medidas para o Algarve. Há que tentar inclinar a seu favor a balança das eleições que, no último sufrágio, pendeu para o Chega.

A enumeração fastidiosa de uma série de medidas já tomadas em diferentes áreas e a defesa das “pequenas mudanças” com impacto na vida dos cidadãos compuseram o quadro, que soou a pouco, especialmente quando se traça uma imagem tão favorável do país, onde até há margem para prometer um superavit até ao fim do ano.

“O Governo está preocupado com o futuro do país”, disse Montenegro. O que será bom é o país não estar preocupado com a falta de estamina do Governo.»


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