«Todos os que têm dirigido a sua solidariedade para quem perdeu casa e outros bens nos incêndios deviam pensar melhor. Estão a esquecer a principal vítima do fogo, que é Luís Montenegro. No Algarve, o primeiro-ministro queixou-se das estações de televisão, que estavam naquele dia a “preencher ecrãs com metade da imagem com labaredas e outra metade com a Festa do Pontal”. Pretendia com isso dizer que a comunicação social tinha o objectivo maldoso e pouco subtil de mostrar que, enquanto parte do país ardia, vários membros do Governo estavam reunidos numa festa. Infelizmente, Montenegro ficou-se pela crítica, e não deu sugestões aos jornalistas acerca do modo como deviam noticiar dois acontecimentos que estavam, de facto, a ocorrer ao mesmo tempo. Talvez devessem mostrar apenas as labaredas. Ou mostrar apenas a Festa do Pontal. Ou mostrar as labaredas, depois mostrar outra coisa qualquer, e depois então mostrar a Festa do Pontal. Entre as imagens das labaredas e as da festa do PSD, uma reportagem que fizesse o papel que aquele gelado de limão desempenha nas refeições compridas, para limpar o palato entre um prato e outro. Talvez pudesse ser mesmo uma reportagem sobre gelados de limão, para garantir que o palato fica limpo e que ninguém associa as imagens do fogo às imagens da festa.
No espaço de pouco mais de um mês, Montenegro é o terceiro político que se queixa da perfídia dos jornalistas. Sócrates declarou ser vítima de uma conspiração da comunicação social, Ventura também se queixa de ter toda a comunicação social contra si, e agora é Montenegro que revela um plano da comunicação social para o atacar. O que isto indica é que a comunicação social é muito mais perigosa do que se pensa. Uma coisa é os jornalistas montarem uma conspiração contra uma pessoa. Duas conspirações já parece demasiado. Mas três conspirações é simplesmente ridículo. O plano parece óbvio: ao empreenderem tantas conspirações, os jornalistas pretendem conspirar contra a própria ideia de conspiração. Quando vários dirigentes políticos, e tão diferentes entre si, se queixam do mesmo suposto inimigo, ficamos com a ideia de que são paranóicos narcisistas com a mania da perseguição, o que é evidentemente impossível. Há realmente uma conspiração em curso. E destina-se a desacreditar quem denuncia conspirações.»

0 comments:
Enviar um comentário