3.8.25

Uma capitulação existencial

 


«Ursula von der Leyen reforçou-se no cargo em dois momentos: na resposta concertada da União Europeia (UE) na aquisição de vacinas para a pandemia e quando se manteve de pé enquanto Erdoğan e Charles Michel ocupavam as duas cadeiras disponíveis. Num mostrou uma vantagem da União, noutro o poder do simbolismo. Tudo o que faltou esta semana, quando se deslocou ao campo de golfe de Trump na Escócia, esperou que ele e o filho acabassem de jogar e, depois de acordar uma capitulação, levantou o polegar, participando na fanfarronice de Trump. Provou-se que a União é “um gigante económico e um anão político”, como disse um antigo responsável da Comissão. A força europeia, com 450 milhões de habitantes e o segundo maior bloco económico do planeta, foi um dos argumentos contra o ‘Brexit’. Trump vai cobrar 10% às empresas britânicas, 15% às da União. O ¬maior banco privado alemão prevê uma diminuição de 25% das exportações europeias para os EUA.

Com este pré-acordo político, que ainda terá de ser negociado secto¬rialmente e aprovado pelos 28 países, 70% das exportações do continente vão pagar uma tarifa de 15% à entrada nos EUA. Há exceções, dos semicondutores a alguns produtos agrícolas e, espera-se, os produtos alcoólicos. Mas nada acontece em sentido inverso. As empresas americanas continuarão a pagar os mesmos 3%, em média. Em 2023, os EUA arrecadaram cerca de €7 mil milhões em tarifas sobre as exportações europeias e, em sentido inverso, apenas entraram €3 mil milhões. Poderia dizer-se que isto confirma o défice comercial. Mas esse défice corresponde apenas a 3% das relações comerciais entre os dois blocos. Trump omite sempre os serviços, principalmente financeiros e digitais, onde a inexistência europeia praticamente compensa a importação de bens industriais e agrícolas. Também neste acordo as poderosas Amazon, OpenAI, Netflix ficam incólumes. Uma semana antes da negociação, a UE mostrou a sua fragilidade, anunciou que desistia da pretensão de taxar as empresas digitais que operam no espaço europeu. O friso de tecnomilionários na tomada de posse de Trump já conseguiu parte do que queria e o mais certo é cair a pretensão de regular as redes so¬ciais e uma parte dos mecanismos de defesa da privacidade pessoal em vigor no espaço europeu. A Europa chegou à negociação a gatinhar. Claro que não podia conseguir melhor do que isto.»


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