«Esta quarta-feira, dia 5 de Novembro, foi feita história. Sensivelmente um ano depois da eleição que colocou Trump de volta na Casa Branca, a cidade de Nova Iorque, a maior dos EUA, elegeu Zohran Mamdani. Um candidato progressista e um declarado socialista democrático, cuja campanha abalou o establishment democrata e ecoou por todo o mundo. A sua premissa foi simples: baixar o custo de vida, indo ao encontro das preocupações mais gritantes do cidadão comum: as contas que faz ao fim do mês.
Por outro lado, a Grã-Bretanha vive, também ela, uma profunda transformação no seu panorama político. A vitória de Zack Polanski na liderança dos Verdes britânicos, pautada por uma agenda igualmente progressista e assumidamente de esquerda, trouxe ao partido um aumento em 80% da sua militância e as sondagens já colocam os ecologistas como a segunda força política. Será esta a bala dourada de que a esquerda mundial precisa?
Não é novidade que, a um nível global, a esquerda tem vindo a perder terreno. Nos seus escombros, erguem-se projectos autoritários de extrema-direita que se multiplicam sem horizonte de fim. A mensagem progressista tem vindo a tornar-se defensiva — face a uma clara ameaça ao regime democrático, a esquerda acantonou-se na sua defesa, na salvaguarda de um sistema cada vez mais obsoleto e incapaz de dar resposta às necessidades de saúde, habitação ou salários do grosso da população.
Não obstante, existe também uma esquerda conivente, tanto com o status quo, como com a ascensão do populismo à direita: uma esquerda que desiste de o ser e dilui-se no centro político, desistindo do Estado Social (como o Labour de Keir Starmer), ou, por outro lado, uma esquerda que coopta a narrativa anti-imigração para o seu próprio espaço discursivo (veja-se o exemplo dos sociais-democratas dinamarqueses ou o BSW alemão).
Mamdani e Polanski são, neste contexto, uma verdadeira lufada de ar fresco. Primeiramente, na sua comunicação (onde existe uma grande aposta no digital). Ambos praticam uma comunicação próxima das pessoas: directa e de fácil compreensão, largando formalismos e termos técnicos. A sua mensagem é simples e apresenta soluções progressistas e socialmente justas para o dia-a-dia, sejam elas um aumento de impostos aos super-ricos, transportes públicos gratuitos ou a garantia universal de cuidados de saúde. E não, não deixam de falar de liberdade social — o feminismo e os direitos LGBTQIA+, temas que a extrema-direita procurou envolver em polémica, não desaparecem do discurso do que aparenta ser esta nova geração de políticos. Muito pelo contrário, são postos em cima da mesa e defendidos justamente, embora não figurem no seu argumentário principal, que tende a cingir-se, de um ponto de vista geral, a questões económicas e de justiça social.
No entanto, a liderança de Polanski e a campanha vencedora de Zohran Mamdani não se cingem ao boletim de voto. Ambas mobilizam. A esperança num futuro mais risonho, insuficiente por si só, quando aliada a verdadeiros objectos de desejo político (que ressoam com as preocupações diárias das pessoas) torna-se um forte instrumento de encontro. Em apenas meses, a campanha de Mamdani mobilizou milhares de voluntários para a sua campanha porta-a-porta, cidadãs e cidadãos que, muitos deles, nunca se tinham envolvido na política. O mesmo sucede com Zack Polanski, no que concerne aos militantes dos Verdes britânicos, cujo número aumentou exponencialmente nos últimos meses, dada a mensagem abertamente progressista e de esquerda do partido (não largando, contudo, o pendor europeísta).
Em tempos de escurecimento democrático, uma luz ao fundo do túnel emerge. Este crescente clarão não é, contudo, uma solução milagrosa e fácil de emular. É escusado dizer que cada realidade política é única, mas urge esclarecer que este novo “modelo” de fazer política soçobra numa importação fragmentada. Não basta, a um político, publicar uma série de vídeos dinâmicos em formato curto; é preciso conteúdo.
Embora exista um grande foco na campanha digital, o que torna a mensagem de Mamdani e Polanski verdadeiramente ímpar é o seu pendor progressista, de esquerda e, talvez o mais importante, ofensiva. Esta esquerda está a trazer os jovens de volta para o seu campo político. Está a reinventar-se e a reinventar o sistema a favor do cidadão comum. Está a enxotar os autoritarismos. E, do nosso lado, seja do Atlântico ou da Mancha, está na hora pôr mãos à obra.»

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