«São notícias isoladas que ajudam a formar o puzzle. A Deloitte recebeu 1,6 milhões de dólares canadianos para fazer um conjunto de estudos para a província da Terra Nova e Labrador. O documento, com mais de 500 páginas, foi gerado — pelo menos parcialmente — por inteligência artificial e tem referências académicas imprecisas e até inexistentes. É a segunda vez que a consultora tem semelhante problema: em outubro teve de devolver 290 mil dólares australianos por causa de um relatório entregue ao Governo de Camberra com bibliografia fantasma e citações de decisões judiciais que nunca foram proferidas. Esta semana, no “Financial Times” surge uma notícia que ajuda a ligar os pontos: c Ao diário britânico, um dos responsáveis da Management Consulted que compilou a informação das consultoras explica: “Há ganhos reais de produtividade por causa da inteligência artificial e isso tem colocado pressão sobre os salários, que é maior nos serviços profissionais e na tecnologia do que no resto da economia.”
É uma alteração de estratégia que tenderá a acentuar-se à medida que a inteligência artificial se entranha na vida das empresas. Várias organizações estão já a abandonar a tradicional estrutura em pirâmide, em que o número de pessoas na base é maior e diminui à medida que se escalam os níveis hierárquicos, e a optar por um modelo em diamante, onde são as idades intermédias que têm maior peso. Nesta fase é possível fazê-lo porque os mais velhos foram jovens que puderam começar pela base e ir subindo. Como será amanhã se os trabalhadores expe-rientes são os jovens hoje?
E o problema não se circunscreve às consultoras. Há sinais por todo o lado. O estudo recente “Generative AI as Seniority-Biased Technological Change: Evidence from U.S. Résumé and Job Posting Data”, dos economistas Seyed M. Hosseini e Guy Lichtinger, da Universidade de Harvard, nos EUA, analisou o perfil de 62 milhões de trabalhadores em 285 mil empresas americanas durante os últimos 10 anos e identificou idêntico padrão: a adoção de inteligência artificial provocou uma quebra na contração de jovens sem que tenha havido alteração no emprego de profissionais mais velhos. Bem sei que os jovens adoram a inteligência artificial. Pelos vistos, não é recíproco.»
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