«A grande participação dos trabalhadores, dos setores público e privado e de todas as faixas etárias, na greve geral da passada quinta-feira e a compreensão com que grande parte dos portugueses encara as posições que os sindicatos estão a assumir face ao conteúdo do pacote laboral desarmaram a inverdade e o cinismo utilizados pelo Governo na construção e gestão política das suas propostas.
A afirmação do primeiro-ministro, feita à última hora, de que pretende colocar o salário mínimo em "1500 ou 1600 euros" e o salário médio nos "2500, 2800 ou 3000 euros" e a leitura manipuladora que fez dos resultados da greve são duas expressões cabais de uma prática política manipuladora que ficou mais a descoberto. Como vai o Governo dar os passos seguintes? Prossegue o afrontamento? Em caso afirmativo, como agirá tendo em conta que os trabalhadores e o povo português estão agora mais alertados, e se confirma que podem surgir caroços de azeitona na engrenagem das alianças políticas de que necessita para formar maiorias parlamentares?
Tornou-se mais evidente que a extrema-direita pode fazer colagem ao descontentamento laboral e popular abjurando, quantas vezes for necessário, os seus objetivos estratégicos, para esconder o que pretende fazer se instalada no poder. Um outro elemento importante que a greve fez emergir foi a constatação de que uma parte dos empresários tem consciência de que lhes é prejudicial esta guerra desencadeada no mundo do trabalho e que a agenda neoliberal não lhes traz vantagens numa perspetiva de desenvolvimento qualitativo. Mas, se lhes for oferecido o maná do trabalho barato, tenderão a acolhê-lo.
Os retrocessos políticos e sociais podem ser impedidos se as pessoas nos locais de trabalho, na rua, nas suas vidas privadas e nos espaços coletivos tomarem consciência dos problemas com que se deparam e se conseguirem interpretar e afirmar princípios fundamentais da recusa da exploração do homem pelo homem, do direito de todos a uma vida digna e do respeito pelos direitos laborais.
Uma greve geral, construída sobre conteúdos objetivos e percetíveis, dá muita força aos trabalhadores. Tem sempre um grande impacto social e pode gerar condições para mudanças no plano político. Os portugueses deram sinais de que não se deixam convencer facilmente pela retórica individualista, mercantilista, egoísta e regressiva que a Direita tem para oferecer.
Ainda é muito cedo para se perspetivar como serão "os dias seguintes". A unidade laboral e sindical construída para dar êxito à greve pode e deve ser mantida sem a mínima cedência a maldades. O apoio político das forças da Esquerda à agenda sindical existiu e foi importantíssimo. Se prosseguir em agendas político-partidárias próprias, mas convergentes, pode abrir chamas de esperança no plano político.»

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