20.6.14

O Tratado que divide as águas



A crónica semanal de José Manuel Pureza (JMP), hoje, no DN, não pode ser mais certeira e oportuna, já que, de facto e indiscutivelmente, «para a reflexão estratégica que o País tem de fazer já sobre os seus próximos dez anos, o Tratado Orçamental é o divisor de águas.»

Em termos de forças partidárias com representação na Assembleia da República, até agora tem sido claro o posicionamento em cada um dos lados dessa linha divisória: PSD, CDS e PS num deles, PCP e BE no outro. Continuará a sê-lo no caso de António Costa levar a carta a Garcia e, simultaneamente, vier a tornar-se o próximo primeiro-ministro de Portugal? Talvez ainda seja cedo para conclusões, mas, por tudo o que vi e li até agora, não posso deduzir, de todo, que o PS venha a mudar radicalmente de posição.

Acontece (e volto a citar JMP) que «o Tratado Orçamental é a constitucionalização da austeridade, ou seja a sua eternização como matriz das políticas para Portugal. As forças políticas e sociais que o tomam como um determinante inultrapassável dos nossos próximos dez anos assumem, com maior ou menor convicção, a austeridade como um caminho que tem de continuar a ser feito, a ser aprofundado, sem cedências nem tergiversações».

E ainda: « O arco do Tratado Orçamental tem, assim, para Portugal, um programa de perpetuação e agravamento da austeridade. Olha para o País daqui a dez anos e todo o caminho até 2024 estará balizado pelo Tratado Orçamental e pela austeridade que ele supõe. Pode depois adornar a imagem com discursos de modernização, de equidade territorial ou de regresso à paixão pela educação. O certo é que, refém da lógica implacável das metas impostas pelo Tratado Orçamental, tudo isso não é senão retórica ou fantasia enganadora para eleitores disponíveis para comprar ilusões. Assumir o Tratado Orçamental como um dado e ao mesmo tempo ser um bocadinho contra ele é algo que é politicamente desonesto. Assumir o Tratado Orçamental como constituição de facto e exprimir ao mesmo tempo vontade de que haja uma convergência das esquerdas é algo não só insanavelmente contraditório como politicamente leviano e incentivador da decepção e da apatia.»

Ou seja, e dando outra vez nomes aos bois (salvo seja...): António Costa pode encher dez Tivolis, e ter cem vezes mais jeito e melhores características para ser secretário-geral do PS, mas isso não chega. Manterá o seu partido encostado à direita, e alinhará fatalmente com esta, se apenas propuser acções de maquilhagem para o Tratado Orçamental. E os que esperam dele a libertação deste governo austeritário sairão uma vez mais frustrados. 
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5 comments:

vmsda disse...

Ainda os resultados das Europeias estão mornos, e já JMP estabeleceu a sua nova Linha Maginot (o Tratado Orçamental) e os arcos que se defrontam: do Tratado Orçamental (PSD, CDS, PS e Cavaco), e da Democracia Constitucional (BE, PC). Parece haver riscos de "eternização", talvez devido à diferença de peso entre os arcos. Aviso ao Rui Tavares e ao Daniel Oliveira: "não há meios campos".

Tudo começou em 2010/2011, quando havia outra Linha Maginot (o PEC4), o Arco Regenerador (PSD, CDS, BE, PC e Cavaco), e o Arco dos Sacrifícios Insuportáveis (PS). Duas ou três eleições mais tarde, seguindo o raciocínio de JMP, a linha mudou de nome, não de natureza, é agora mais europeia, e os arcos transmutaram-se, estão irreconhecíveis. Que concluir daqui se não que JMP é fraco em geometria?

Joana Lopes disse...

V, se queres fazer uma comparação entre PEC IV e TO como divisores destas águas, então quem mudou de lado, juntando-se ao PS, foram PSD E CDS. O PCP e o BE mantiveram-se onde estavam.

vmsda disse...

Joana: seria cruel exigir que depois de terem os votos do PC e do BE, o PSD e o CDS - agradecidos - não tivessem mudado de posição, uma vez que têm uma concepção dinâmica da política, eternizações não são com eles.

O PC e o BE mantiveram-se onde estavam, como bem notas. E se interpreto corretamente a tática de JMP, vão manter-se onde estão.

Joana Lopes disse...

V, não sei se percebo a 1ª parte do teu comentário porque o PSD+CDS mudaram porque ganharam as legislativas. Ponto.

Em relação ao posicionamento relativamente ao TO (é isso que está em causa), não se trata de uma opinião do Pureza, foi clara e sistematicamente afirmado durante a campanha para as Europeias, pelos dois partidos.

Rogério G.V. Pereira disse...

Levo parte...
e, claro,
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