Cavaco Silva e os seus conselheiros têm toda a legitimidade para escolherem quem vão condecorar e porquê, neste desfilar anual de orgulhos patrióticos.Os vários presidentes da República têm sido por vezes acusados de banalização pela quantidade de nomeados e, pontualmente, por designações mais ou menos polémicas (como foi o caso, há cinco anos, quando Jorge Sampaio atribuiu a comenda da Ordem da Liberdade a Isabel do Carmo).
António Gentil Martins recebeu hoje a Ordem do Infante D. Henrique, aparentemente pelo conjunto da sua carreira como médico. Foi esta importante, não é de louvar que tenha andado pelo mundo a separar siameses? Certamente. Mas é também como médico que tem tomado, ao longo da vida, posições extremistas especialmente intolerantes. Muitos se lembrarão da sua ferocidade na oposição ao aborto durante a campanha sobre a IVG, em 2007, talvez poucos saibam que leva a defesa das famílias numerosas ao ponto de ser contra o uso obrigatório de cadeirinhas para crianças nos automóveis porque este impede os casais de terem mais do que dois filhos!
Mas, precisamente quando há entre nós uma sensibilidade especial para tudo o que se relaciona com o tema da homossexualidade, talvez valha a pena recordar, sem surpresas, que, para ele, ela é «anti-natural», porque, «a natureza humana é feita para se reproduzir como qualquer espécie animal». E vai mais longe quando fala de transsexuais: «Há doidos em todo o mundo. Discordo da transsexualidade. Não me venham dizer que o cérebro é diferente, pois ninguém provou que seja. Há todo o género de aberrações na natureza humana. A transexualidade é um disparate, em termos da natureza humana biologicamente normal, e não tem sentido (...). Pessoalmente, sugeriria o apoio do psiquiatra.»
Repito: não é o cidadão António Gentil Martins que faz estas afirmações, mas sim o médico cuja carreira foi hoje enaltecida.
Arrisco-me a pensar, sem grandes riscos de erro, que Cavaco nunca teria condecorado Isabel do Carmo, nem Jorge Sampaio o faria no caso de Gentil Martins. São as regras deste jogo em que vivemos. Mas há sempre a possibilidade – e a liberdade – de protesto. ILGA, MPI e as quase 7.000 pessoas que aderiram a este movimento: nada a dizer?
(Referência: Entrevista de AGM ao Jornal de Leiria)
5 comments:
Deve ou não deve haver este feriado Naciona?
Não é isso que está em causa. Mas tanto poderia haver como não, ser nesta data ou numa outra.
Ainda bem que Jorge Sampaio e Cavaco Silva têm escolhas diferentes. Se as escolhas fossem iguais, que confusão apareceria na minha cabeça... já tão perto da senilidade.
A única escolha errada foi a de Cavaco Silva. Foi, pela certa, uma escolha feita ao espelho. Ali, um tanto a despachar. É um qualquer, entre nós, é um qualquer entre os piores de nós. Quase um anónimo.
E já que estamos também numa escolha das grandes obras dos portugueses, alteremos o objecto de tal escolha e façamo-la, antes, entre as obras dos Grandes Portugueses. Eu votaria na marquise da casa de Cavaco Silva. De caras.
Lamenta-se que os valores da Pátria, estejam cada vez mais esquecidos, Lamenta-se que que prevaleça a estupida referência a medalhas, esquecendo que se comemora Camões e que este encarna o espírito admirável e único do português, que comungou mundos e à Humanidade legou, na portuguesa língua, hoje uma das grandes referências a nível mundial, uma obra a toda a Humanidade, como monumento maior ao Portugal de sempre. Lamenta-se se dê mais relevo a ILGA, que ao 10 de Junho em que deviamos dedicar uma acentuação especial às comunidades portuguesas mundo fora, heróis incógnitos da saga da emigração e que são, nas paragens onde se encontram , da Oceânia à América, testemunhos maiores de honradez, de trabalho e de cidadania, mas emfim, ainda temos gente assim.
Se calhar não percecebi bem, mas eu por acaso sou emigrante e, apesar de achar que o a língua portuguesa é de facto importante, lamento que por exemplo na procura de um emprego eu seja poste de lado pq o meu português é o menos falado. Talvez com um acordo ortográfico o meu testemunho de honradez fosse mais próximo do testemunho de honradez que fui no meu trabalho em PT.
Sobre a ILGA, esta é apenas um meio e infelizmente acho natural que lhe seja dada mais atenção porque a honra de um país é feita também pelos exemplos de liberdade e democracia. Assim, acho preferível tentar mudar o país para que seja mais justo no futuro do que celebrar uma imagem do passado.
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