Vale a pena ler o artigo «Os bastardos da guerra descobrem as suas raízes», no Público de ontem, sobre as vidas e as humilhações sofridas pelos filhos de soldados alemães, que nasceram durante os quatro anos da ocupação nazi na Europa.
Regressei imediatamente às minhas vivências estudantis na Bélgica durante os anos 60. Num início de ano lectivo, acabara de chegar à residência universitária uma caloira e uma das responsáveis da dita residência pô-la num quarto ao lado do meu e pediu-me que lhe desse apoio porque era um «caso complicado». Explicou-me mais tarde que ela não sabia que o pai era um guarda prisional alemão que tinha violado a mãe antes de esta escapar, por pouco, ao envio para uma espécie de campo de concentração. Nunca esqueci esta história – pura ficção de terror para os meus verdíssimos anos, saídos há pouco da pacatez cinzenta em que Salazar nos tinha preservado.
Mas só ontem me apercebi da dimensão do drama: estima-se em 800.000 o número destas pessoas, muitas delas ainda vivas, que só conseguiram começar a falar depois da morte das mães e que tentam agora identificar irmãos dos outros lados das fronteiras.
Quantos iraquianos não irão procurar pais americanos ou ingleses na segunda metade do século XXI?
Regressei imediatamente às minhas vivências estudantis na Bélgica durante os anos 60. Num início de ano lectivo, acabara de chegar à residência universitária uma caloira e uma das responsáveis da dita residência pô-la num quarto ao lado do meu e pediu-me que lhe desse apoio porque era um «caso complicado». Explicou-me mais tarde que ela não sabia que o pai era um guarda prisional alemão que tinha violado a mãe antes de esta escapar, por pouco, ao envio para uma espécie de campo de concentração. Nunca esqueci esta história – pura ficção de terror para os meus verdíssimos anos, saídos há pouco da pacatez cinzenta em que Salazar nos tinha preservado.
Mas só ontem me apercebi da dimensão do drama: estima-se em 800.000 o número destas pessoas, muitas delas ainda vivas, que só conseguiram começar a falar depois da morte das mães e que tentam agora identificar irmãos dos outros lados das fronteiras.
Quantos iraquianos não irão procurar pais americanos ou ingleses na segunda metade do século XXI?
7 comments:
Joana, o caso que relata é o de uma violação mas, pelo q sei, não é esse o "padrão" destes "têtes de boche".
Certamente que não, Shyz. Aliás, vê-se isso bem na leitura do texto linkado. Este foi o único de que tive conhecimento directo.
A forma como Os francesEs depois da guerra trataram As francesAs que durante a ocupação namoraram com alemães é uma medida directa da grandeza de alma dos franceses, e da da França.
(as maiúsculas sublinham o género, porque não sei fazer "bold")
Joana,
gostei muito mais do teu título do que do original. Revela outra sensibilidade, sabes.
Bastardos? Não gostei mesmo nada.
É por estas e por outras que é pena não haver mais mulheres na política, e, já agora nas empresas (embora não goste nada do sistema de quotas...).
Hoje, a população Parisiense e Lisbonense, são iguais às selecções nacionais de futebol, de cada um dos paises.
Portanto, as adaptações têm que ser resolvidas com outras mentalidades.
São rastos de guerras, tambem.
Tem as suas complicações.
Mas tudo se cria.
Vitor, o título do artigo do Público pode ser de aparente mau gosto mas é fiel à expressão que os franceses usavam para tratar estas crianças "bêtard de guerre" (a outra expressão foi a q usei no primeiro comentário) e q, só por si, dá bem ideia do q tiveram de sofrer ao longo dos anos.
Manuel, está a ser irónico, certo?
Estou a ser irónico, mas posso refazer a frase para falar a sério e dizer exactamente o que penso, sem a mais pequena ponta de ironia:
"A forma como Os francesEs depois da guerra trataram As francesAs que durante a ocupação namoraram com alemães é uma medida directa da grandeza de alma dos franceses, e da da França."
Sem ironia saiu completamente diferente.
Isto que penso ainda hoje se pode comprovar pelo acolhimento que o eleitorado francês dá a Le Pen, ou ao baixote casado com uma mulher modelo que chamou escumalha aos imigrantes para se tornar popular antes de se candidatar.
Tudo manifestações do mesmo ressabiamento que esteve por trás das sovas e das humilhações que reservaram a essas mulheres, sob a capa da traição à pátria, claro!
Por acaso nunca ouvi falar de nenhum tratamento especial dado aos franceses que se meteram na cama com alemãs durante a ocupação...
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