11.2.10

Uma espécie de parlamento sem gravata nem regimento




O título é tirado do último parágrafo de um post que o Zé Neves escreveu ontem:

«A comunidade blogoesférica, uma espécie de parlamento sem gravata nem regimento, se existe e se foi inventada por alguém foi por uma geração de nove ou dez bloggers (digo geração porque é assim que se gostam de ver) que reivindicou para a blogoesfera política um estilo próprio de acção, uma geração que passa a vida a dizer que é de esquerda como os partidos já não são e que é de direita como os partidos já não são e que, ainda assim, sendo mais ideologicamente “livre” e “frontal”, tem amigos de um e de outro lado da barricada.» (Leia-se o resto do parágrafo.)


Não sei se como causa ou se como efeito do que o Zé Neves caracteriza bem, mas certamente com alguma conexão embora ela possa não ser óbvia, assistimos a uma verdadeira explosão do número de grandes blogues colectivos - nascidos do zero, por cisões ou «re-cisões» -, bem como ao reforço numérico dos já existentes. Com as costas protegidas pela pertença a um grupo e pelos valores do Sitemeter, os tais poucos bloggers que o Zé Neves refere (pessoalmente penso que são mais do que nove ou dez), falam e argumentam de blogue para blogue, quase sempre em nome da esquerda ou da direita, em amiguismo ou ao ataque, mas com a tal «cumplicidade de geração» que tudo permite, dos beijinhos ao insulto. São eles os verdadeiros líderes de pequenos exércitos de turbo-bloggers que acabam por se desdobrar, quantas vezes com os mesmos textos, em duas ou mesmo em três arenas. Transformaram os blogues em conjuntos de colunas de notícias e de opiniões avulsas, que pretendem substituir o papel dos jornais, tal como – e regresso agora ao texto do Zé Neves – os tais blogolíderes se movem «numa espécie de demarcação em relação à política dos partidos e seus dirigentes». Em paralelo, deixam morrer pouco a pouco os seus blogues individuais, por vezes excelentes.

Com lugar para as louváveis excepções a todas as regras, estes grupos de pessoas, que muitas vezes nada têm a ver umas com as outras e que escrevem em paralelo com pouco ou nenhum valor acrescentado pelo facto de se apresentarem em conjunto, pretendem, como grupo, usar a força de pressão que o ranking no Blogómetro lhes confere e, individualmente, o prazer de serem lidas por multidões (extraordinário objectivo de vida cuja compreensão me ultrapassa). Tudo isto tem como consequência inevitável que cada blogue publique catadupas de posts por dia e provoque a existência de dezenas, ou mesmo centenas de comentários a um único post, o que gera a impossibilidade de o próprio autor os ler todos e, no leitor, a frustração de ter formulado uma pergunta honesta que nunca chega a merecer uma resposta. (E já nem falo da insanidade de grande parte das Caixas de Comentários dessas poderosas máquinas…)

Nada disto era assim há três anos, nem mesmo há dois, e talvez valha a pena perceber por que razões aqui chegámos. Note-se que até aprecio blogues de mais de uma pessoa, se possível de um grupo muito pequeno e razoavelmente homogéneo, em que se sinta a «cola» da cumplicidade entre os seus membros e a preocupação de manterem um espaço de debate calmo e civilizado. Mas encontrá-los, hoje, é como esbarrar com uma agulha no fundo de um palheiro.

Enfim, contra factos valem pouco as evidências e eles, os factos, estão aí e não me dão razão.

6 comments:

jpt disse...

Já que tenho andado por aqui a discordar de si deixo agora o meu apreço pelo post. (Fui a um desses turbo-blogs por via de uma ligação sua e fiquei embasbacado com a agressividade que ali se encontrava nos comentários entre os próprios membros do blog - se não se gostam para que blogam juntos?)

Joana Lopes disse...

Ora bem... Exacto, ainda se isto fosse bem pago! Mas pro bono?

José Meireles Graça disse...

Por outro lado, perde-se tempo a visitar blogues de um só autor que, por o serem, não têm novos textos dias a fio; e, num blogue colectivo, pode scrollar-se o texto dos autores dos quais não se gosta - ou ler na diagonal. Quanto aos comentários, dou-lhe razão. Mas não percebo por que razão (no Blasfémias, p. ex.), os donos autorizam uma quantidade inverosímil de insultos, irrelevâncias e necedades. Dito isto, este blogue está na minha lista ... e não são precisas companhias.

Joana Lopes disse...

Obrigada, JMG
É verdade que há blogues individuais com pouco movimento, mas, se usar o Bloglines, é avisado quando há novos posts e escusa de perder tempo a lá entrar inutilmente.
Mas eu, em princípio, não tenho nada contra blogues colectivos, mas sim quanto ao actual modo de funcionamento de alguns. Foi isso que tentei explicar.

ABM disse...

Como só tendo a ler meia dúzia de pessoas, não sigo as tricas blogosféricas portuguesas, que tendem a ser elaboradas por gente de meia idade com computadores e que, comparadas com o que se passa nos EUA (que inventaram a tecnologia e os costumes)onde os teenagers e os intelectuais tomaram conta da crista da onda, não tem nada a ver. Pecando pela simplicidade, eu acho que as pessoas que escrevem assim e aqui fazem-no porque podem, porque querem e porque devem sentir alguma emoção de poderem comunicar os seus pensamentos com terceiros. A partir daí, o grau de excelência ou de mediocridade do que são e do que dizem devem ser aferidos por cada um. Não seguindo as regras mais estratificantes da imprensa escrita, vista e falada, aqui é mais uma selva. Mas como uma selva, pode-se encontrar um monstro ou uma jóia. Já sobre as dinâmicas das partilhas de blogues, só conheço uma e se calhar não é exemplo.

Joana Lopes disse...

O blogue em que escreve, ABM, se é aquele que julgo, é uma das excepções que confirma a regra, pela «civilidade» nos posts e na Caixa de Comentários.