Já está praticamente tudo dito sobre os «salários» devidos a António Mexia em 2009: 3,1 milhões de euros, de ordenado fixo, variável e prémios.
O que está em causa não é a gestão e remuneração por objectivos, que considero não só inevitável mas benéfica, no sistema em que vivemos e enquanto não conseguirmos outro melhor. É a falta de vergonha e até de senso, para não empregar expressões priores, que esta ponta do iceberg revela. Porque Mexia não é o único gestor português em circunstâncias semelhantes como, em jeito de queixinhas, não deixou de recordar.
A situação actual do mundo, que nos atinge, não teve nada a ver com isto? Claro que teve e que tem. E, correndo propositadamente o risco da demagogia (por vezes tão salutar…), fica-me um sabor amargo ao lembrar que longe vão os tempos em que ainda se gritava, com pouca ou muita convicção, «os ricos que paguem a crise».
O país vive acima das suas possibilidades, mas há nele alguns, muito poucos, com «possibilidades» desmesuradas que são uma verdadeira bofetada para os outros. Talvez só percebamos isso se o FMI nos entrar pela casa dentro, o que esperemos que não venha a acontecer.
É bom não esquecer que o Estado, com 20% do capital da EDP, é o seu maior accionista. E leio com espanto que, para a semana, vai ser discutida em assembleia-geral «a redução dos prémios anuais dos gestores executivos de 100 para 80% do vencimento fixo».
Devagar, devagarinho, talvez o engenheiro Sócrates chegue um dia ao socialismo, provavelmente ajudado pela sua ala esquerda. Vejo que António José Seguro considera «obsceno» o caso Mexia e que Ana Gomes fala da «estarrecedora insensibilidade» de Sócrates. Serão masoquistas? Ainda estão no PS, porquê? Alguém os obriga? Acreditam mesmo que vão «reformá-lo»?
P.S. - Contributo de Manuel Vilarinho Pires (ver Caixa de Comentários):
11 comments:
E com isto chegamos à conclusão que somos mesmo um povo de brandos costumes, situação antiga que se vem reforçando com a anestesia lenta, mas eficaz, que o capitalismo democrático nos vem aplicando. Apesar de Mário Soares (é verdade, quem diria ...) vir alertando há já uns tempos para a possibilidade de uma rebelião, tais as injustiças sociais dos tempos que vão correndo, não se perspectiva qualquer sobressalto neste pachorrento rectângulo à beira mar plantado. Mas que não há moral que consiga justificar estas afrontas, lá isso não há. Que fazer, então? Apenas mais abstenção no dia da votação? É um dilema.
Eu nunca me abstive (a não ser por estar fora) e tento não me calar - aqui, por exemplo.
Claro, Joana Lopes, e que viva por muitos mais anos para manter esta porta para a revolta. Eu também nunca me abstive, e, ao escrever aquilo que escrevi, apenas pretendi dizer mais uma vez o que muitos já disseram: factos como este apenas levam as pessoas (mal, naturalmente) a uma atitude de revolta passiva, não votando.
Joana e António,
já que estamos em matéria de revelação voluntária do sentido do voto, gostaria, por uma questão de princípio, que ficasse claro que a abstenção e o voto em branco são coisas diferentes, e que eu talvez tenha votado mais vezes em branco do que de qualquer outro modo.
Saudações democráticas
msp
Claro que voto em branco é diferente de abstenção, Miguel. Mas eu não tenho mesmo feitio para votar em branco! Nunca o fiz.
É preciso avisar o Cristiano Ronaldo, o Figo e toda a malta.
Então onde estão os golos destes gestores?
Quem é que vai jogar contra o FMI?
É que parece que estes gajos vão entrar no campeonato!!!!
Joana, a não ser que tenha interpretado mal a tua última frase, parece-me que colocas em relação à continuidade de A Gomes e A J Seguro no PS no mesmo pé em que eu, em anteriores trocas de opiniões nesta mesma arena, coloquei a questão M Alegre.
Que está ele a fazer (ainda) no PS?
Podia também chamar à colação uma outra troca de opiniões sobre o caso M M Carrilho, na qual eu também não entendi a posição de MMC, mas todos os outros intervenientes no debate a perceberam.
Sou eu que estou a ver mal, ou posições idênticas merecem tratamentos diferenciados?
Vítor,
Distingo totalmente a discussão sobre o Carrilho pelas razões que então aqui disse: não compareceu a uma votação, fez-se substituir por questões de «objecção de consciência». Aprovo sem reservas.
Os outros três casos têm semelhanças mas também diferenças: citei o AJSeguro pela afirmação que agora fez, mas nem o identifico, de facto, com a tal chamada ala esquerda do PS, nem lhe aprecio o estilo.
Ana Gomes: pessoalmente, tenho muita dificuldade em entender como e para que é que pessoas como ela aturam o PS, o que esperam conseguir. Julgo que pensam ter uma acção positiva em tribunas como por exemplo o P. Europeu, o que só é possível dentro de um partido. Mas ultrapassa.me, a partir de um certo nível de discordância, Eu já teria batido com a porta.
MAlegre achará que o PS é tanto, ou muito mais, dele do que de Sócrates, ou que só é deste episodicamente. (Isto sou eu a interpretar...) Mas é verdade que está numa posição limite.
Imaginava que fosse, mais ou menos, esta a tua resposta. No fundo, já nos conhecemos há tantos anos...
Obviamente respeito-a pois sei que é sincera.
Mas cada vez que debato este tipo de situações, mais me convenço que dificilmente conseguiria aderir a um partido político - é preciso engolir muitos sapos.
Não possuo, de facto, tanta capacidade para estar sem estar ao mesmo tempo.
Moi ici, je suis pan-pan fromage-fromage. (para desanuviar)
Ora vejamos... enciclopédia "Brassens"... partilha de lucros com gestores, bónus... ah! Cá está!
A partilha de lucros através da atribuição de bonus de gestão pode ter consequências indesejáveis.
Segundo o autor, e com base numa experiência alegadamente auto-biográfica, "...despite evidence that shows that managers usually enjoy substancial bonuses, extreme cases have been found in which bonuses induced managers to quit their jobs and even change profession..." (tradução livre do francês).
In "Le mouvais suget repenti", http://www.youtube.com/watch?v=-G1ogbeXx5s
Esta foi como P.S. ao post: perfeito :-)
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