28.5.10

Deus, Trabalho e Família


Hoje, 28 de Maio, em jeito de comemoração de mais um aniversário da «Revolução Nacional» de 1926, vai ser lançado oficialmente o Movimento Assembleia. «Deus, trabalho e família» serão as suas principais linhas de força (registe-se: «trabalho» em vez de «pátria»), numa revisita actualizada do lema sagrado do nosso fascismo.

Tendemos a encolher os ombros quando surge mais uma iniciativa da «nacionalistas e salazaristas», crentes que estamos no insucesso garantido da extrema-direita em Portugal. Mantenhamos essa fé e alimentemos a respectiva esperança. Mas convém talvez não esquecer que, ao longo da História, tem sido em tempos de crises, por vezes bem menores do que aquela que estamos agora a atravessar, que projectos deste tipo acabam por agregar muitos descontentamentos e outros tantos contidos desesperos.

Enquanto nos digladiamos em questiúnculas quantas vezes sem sentido, outros poderão ir avançando de mansinho. Oxalá se trate apenas de mais um (longo) Manifesto, que está em linha, e do qual extraio algumas passagens que me parecem especialmente reveladoras.

«Recusamos também a falsa dialéctica de Direitas e Esquerdas com que se pretende dividir o pensamento para submetê-lo. Consideramos que existem apenas governos consensuais e conflituosos. (…)

Consideramos que as democracias geridas pelos Partidos Políticos têm sido insuficientes e ineficazes, voluntária ou involuntariamente, e impotentes para resolver os problemas angustiantes da pobreza e do desemprego. (…) Em resumo, as democracias partidárias não só não têm vocação para erradicar a pobreza como a têm apresentado de modo crescente. (…)

Para nós a família é a única fonte de conservação e desenvolvimento natural da espécie humana, unicamente entendida pela união de dois seres de género diferente com viata à natural perpetuação da espécie. (…)

Não podem existir interesses opostos de patrões e operários. Deve existir a colaboração pacífica e solidária entre os elementos da produção, para que todos contribuam para a prosperidade colectiva. (…)

Não rejeitamos o trabalho estrangeiro em empresas portuguesas. Apenas não o legitimamos havendo portugueses desempregados. (…)

Deve ser restabelecida a disciplina que o liberalismo anarquizou, não se justificando nem a greve nem o «lock-out». (…)

Num país de raiz Católica Apostólica Romana, reconhecemos Deus como fonte de toda a razão e justiça, e seguimos a doutrina social da Igreja de matriz Cristã.»

(Notícia aqui)
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7 comments:

Cristina Gomes da Silva disse...

Precisamos mesmo de estar atentos, Joana. Obrigada e um abraço

Manuel Vilarinho Pires disse...

Joana, cá vai mais um desacordo, acho eu...

Infelizmente, o teu receio de que em tempos de crise movimentos destes possam ter uma capacidade de mobilização inesperada pode ter algum fundamento.
Não digo isto por pensar que eles tenham alguma capacidade de mobilização significativa, assumo que não têm, mas pelo facto de, por se terem ilegalizado as organizações de inspiração fascista, a sua actividade ser clandestina e, portanto, não haver meios de aferir a sua capacidade de mobilização real.
A última vez que uma organização clandestina saiu da clandestinidade em Portugal, saiu com força suficiente para ter estado muito próxima de tomar o poder, contra a vontade evidente do Povo.
Por isso, sou de opinião que as organizações, mesmo partidos, de inspiração fascista não deviam ser proibidas, e estou convicto de que se fossem permitidas estariam reduzidas a uma expressão tão insignificante que os seus defensores seriam bem mais murchitos do que são, insuflados com a ilusão de terem razão e apoio popular.

Joana Lopes disse...

Mas eu julgo que este Movimento se vai legalizar e pretende ser tudo menos clandestino ou reconhecer-se sequer como «fascizante».

virgili o vargas disse...

Joana, na minha opinião, tu tocas no ponto crucial na primeira frase do teu 3º parágrafo. Ou seja, quando dizes "Enquanto nos digladiamos em questiúnculas quantas vezes sem sentido".

Por exemplo, tem algum interesse para este País a candidatura do Manuel Alegre? Qual é o valor acrescentado?

Será que esse valor é mesmo sentido realmente pela generalidade do povo português, ou é apenas uma "birra" de uns tantos intelectuais da nossa esquerda?

Serve para quê? para termos um presidente poeta, com boa voz para a rádio/tv? Para termos um residente que tem um passado de luta antifascista? E a presidência é um prémio para esse passado?

Não há mais ninguém neste País?

Joana Lopes disse...

Virgílio,
Até alguém decidir o contrário, este país elege um PR de 5 em 5 anos.

Podia resolver-se a questão deixando Cavaco apresentar-se sozinho e fazer a dobradinha sem concorrência. Eu, como já não o posso ver nem pintado, gostava / ainda espero que volte para casa.

Agora: é MA o candidato ideal? Não, de todo, na minha opinião. Não havia mais ninguém neste país? Certamente que sim, podia mesmo dizer-te aqui 10 nomes, incluindo alguns que sei que foram pressionados para se candidatarem e não quiseram fazê-lo. E que teriam certamente o meu voto se tivessem avançado, mesmo contra Alegre.

Mas... contra factos, há poucos argumentos.

Não queres avançar tu??? :-)))

(Esqueci-me de dizer que, quanto a FNobre, não muito obrigada.)

virgili o vargas disse...

Joana, eu avançar não avanço porque ainda não perdi o juízo e não sou competente nesse papel. O Cavaco e o Nobre tb não reunem as minhas simpatias, e não levam o meu voto.

Mas, acreditando eu que até conseguias listar 10 nomes - o que me intriga, é que, de facto, não se vê aparecer mais ninguém.

Só estes movimentos a que o teu post se refere, é que parecem ter alguma vontade de mobilização.

E a esquerda onde anda? E o Alegre ainda acredita que com uma esquerda assim mobilizada vai ganhar?

Joana Lopes disse...

Admitindo que, por esquerda, se entende PS, PC, BE e tresmalhados:

- O PC joga sempre sozinho e depois desiste, se necessário.

- Ficou no imaginário o milhão de votos que Alegre teve em 2006 - para ele, para o BE e para uns tantos tresmalhados que nisso apostaram (não só para as presidenciais mas, antes, para uma união qualquer, que não se concretizou, para as últimas legislativas.

- O PS, que não queria Alegre mas sabia que ele se candidataria, não fez o trabalho de casa preparando, com dois ou três anos de antecedência, um candidato que pudesse bater Cavaco (ou, em alternativa, Sócrates pensou até ao Verão passado que até era porreiro ter Cavaco em Belém). Agora, não tem nada na manga.

- Falta ainda M. Soares. Como nunca perdoará o que Alegre lhe fez, não descansou enquanto não arranjou alguém que o lixasse. E assim apareceu, à 25ª tentativa, F. Nobre.