Texto de José Luís Saldanha Sanches, publicado em Caminhos da Memória, 5/10/2008
O centenário do 5 de Outubro está próximo e as comemorações do 5 de Outubro – e em especial o cinquentenário da comemoração da República, que coincidiu com a decadência do salazarismo – foram marcos na resistência. Todos sabemos isso. A contraposição do regime democrático do princípio do século ao regime autoritário vigente funcionava como um argumento chave na narrativa democrática.
O 25 de Abril teve essa componente ideológica e essa componente institucional. A comparação entre as liberdades republicanas e o autoritarismo salazarista era uma parte essencial do discurso oposicionista. Aquilo que sobrava dos políticos republicanos (alguns aderiram ao novo regime) teve uma importância idêntica na construção de uma alternativa: sempre que havia eleições e possibilidade de agitação, o PCP agia com a cobertura dos veteranos da República e dos republicanos pós-república.
Mas – e este mas não é uma mera restrição secundária – o 25 de Abril serviu também para demonstrar o vazio democrático da República.
Comecemos pelo 5 de Outubro que conhecemos da reconstituição histórica e façamos a comparação com o 25 de Abril: a revolta republicana teve o apoio dos republicanos e de uma parte do movimento operário. Nada que possa comparar-se ao extraordinário apoio popular, a mobilização total da rua a que assistimos no 25 de Abril.
Para não falar do sufrágio universal (só depois do 25 de Abril) ou do fim daquela tradição monárquica das eleições saírem dos governos em vez dos governos saírem das eleições. Outra novidade absoluta da política portuguesa. Na República como na monarquia imperava o caciquismo propriamente dito (com donos de votos) e as chapeladas eleitorais eram moeda corrente. O Morgado das Perdizes sobreviveu (com novas formas) à implantação da República e as consultas ao eleitorado continuaram a ser dominadas e predeterminadas pela manipulação dos governos.
Tudo isto deve ser recordado quando se comemora a criação de um regime republicano em Portugal: um regime democrático cujas fragilidades e fraquezas estiveram na origem do regime salazarista que foi o seu sucessor imediato.
...
...
2 comments:
E... na actualidade? O caciquismo ter-se-á já ido? E as fidelidades partidárias (mesmo na esquerda)? E o votar nisto ou naquilo "porque sim"?
2010 m. spalis 4 d.,pirmadienis
O verdadeiro carácter da república foi a produção de falta de carácter?
dúvidas existencialistas
ou a falta de carácter é inerente às estruturas do estado português?
tal como herdamos corporativismos
da república ditatorial salazarista
teremos também herdado falta de carácter dos políticos da monarquia?
estas dúvidas avassalam-me as meningezitas
ASCENSÃO E QUEDA DOS GRANDES EDUCADORES NACIONAIS
dos caciques sem carácter
ao carácter sem povo
Enviar um comentário