No Público de ontem, uma longa entrevista a Eric Toussant, concedida durante a sua última estadia em Lisboa para participar na Convenção da «Iniciativa por uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública».
Alguns excertos e conselho e leitura na íntegra:
«Esta é uma crise que vai durar 10 ou 15 anos, porque o problema fundamental não é a dívida pública, mas sim os bancos europeus. E não estou a falar dos pequenos bancos portugueses ou gregos. O problema é que os grandes bancos (…) estão à beira do precipício. Isso é muito pouco visível no discurso oficial. Só se fala da crise soberana, quando o problema é a crise privada dos bancos. (…)
Esses planos vão piorar a situação desses países [Grécia, Portugal e Irlanda], isso é absolutamente claro. A redução maciça das despesas públicas e do poder de compra da maioria da população vai diminuir a procura e as receitas fiscais e provocar ainda mais necessidade de o país se endividar para pagar a dívida. (…)
A auditoria é um processo promovido sobretudo por cidadãos para romper o tabu da dívida soberana, que nunca se discute nem se analisa. Até pode ser má, mas há que pagá-la, porque uma dívida paga-se sempre, quando, na realidade, tanto ao nível de um particular, de uma empresa ou de um Estado, uma dívida ilegítima, ilegal ou imoral é uma dívida nula. (…)
Há uma chantagem da troika, que dá crédito para pagar aos credores, que são eles próprios e os bancos dos países do Centro europeu, e, em contrapartida, exige austeridade. Não há dúvida: é uma dívida ilegítima.»
P.S. – Para uma melhor compreensão do pensamento de Eric Toussaint, ouvir uma longa intervenção em seis pequenos vídeos, gravada durante uma outra visita a Lisboa.
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5 comments:
Caríssima Joana Lopes,
Muito bem, a Oeste nada de novo.
O discurso minimal-repetitivo da "culpa dos bancos" prossegue 'ad nauseam' como um disco riscado a girar sem que seja quem for dê por ela.
Há uma "culpa dos bancos" e do sistema financeiro de quem estes são os principais actores e agentes? Há sim senhor, é verdade, estamos fartos de o saber.
Mas há algo de muito mais grave de fundo, de que a 'culpa dos bancos' é somente a ponta do iceberg, e de que ninguém, da Esquerda à Direita, parece querer falar; algo que carrega consigo uma 'culpa' muito, mas muito maior, e que é feita de várias outras 'culpas' que pesam sobre todos nós — essa é que é a trágica realidade.
Há uma 'culpa' do galopante declínio da produção industrial do chamado '1º Mundo' — o tal (ainda) dito industrializado, ironia das ironias, dos E.U.A, à Europa, ao Japão — isto é que é mais que evidente!, basta reparar na origem de 90% do que nos chega hoje às mãos, sobretudo no que toca a bens de uso — toda gente queria de tudo um pouco a preços 'decentes', o resultado está à vista: o grosso da produção de praticamente tudo o que nos venha à cabeça, está hoje concentrado em meia-dúzia de pontos do globo, e na generalidade dos casos, no continente Asiático, com a República Popular da China à cabeça — isto salta à vista.
(CONT.)
Convençam-se de uma coisa, de uma vez por todas: quem verdadeiramente conta é quem tem em mãos o providenciar de "condições materiais de existência", fazendo aqui uso da mais elementar retórica marxista, e isto é um facto inegável.
Ora, e uma vez mais, quem hoje dá as cartas não é quem está em Berlim ou em Paris ou em Bruxelas.
É sim quem está em Pequim — o natalício caso EDP/REN é só mais uma breve amostra do que aqui afirmo, há inúmeros outros casos de aquisições em bloco de sectores estratégicos cruciais para economia europeia por parte de testas-de-ferro de Hu-Jintao e Cª, como a Three Gorges Corp.. (fica uma amostra: http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704355304576214683640225122.html)
É lá que está hoje o dinheiro que tanta falta nos faz , é de lá que o dito vem e é para lá que o dito vai, não tenhamos as mais pequenas ilusões a esse respeito, Joana!
E será assim não para os próximos 10 ou 15 anos mas sim para os próximos 50 a 100, e enquanto as pessoas não perceberem de uma vez por todas o que se está a passar.
O empobrecimento do Ocidente e seus afins cresce hoje exponencialmente com o crescimento económico da Ásia emergente.
Quisemos todos engrossar o sector terciário, entre juristas, 'consultores', designers e arquitectos, mestrados e doutorandos, fazermo-nos todos distintos 'prestadores de serviços', e a pesada e 'indigna' tarefa de produzir algo que se veja transferimo-la em bloco para "outros", os tais "outros" que tudo hoje fazem 1/50 do custo de produção cá, sim esses mesmos "outros" a quem hoje mendigamos a compra, perdão o 'investimento', de/em tudo quanto é sector produtivo que nos ainda resta. Agora, hèlas!, toda a gente se queixa e 'a culpa é dos bancos'.
Recordo-lhe a este respeito que só no ano em que deixei o país, 2008, e só na região Norte! mais de 300 unidades industriais fecharam portas — quem tiver dúvidas que consulte os registos e os jornais de então — isto só em 2008 e só no Norte! fora tudo o mais que perdemos ao longo de toda a última década e meia, e agora vamos pensar no resto da União Europeia, porque não estamos sós nesta nau dos loucos...
Quanto é que este 'discreto' processo de desmantelamento geral dos tecidos produtivos nacional e europeu — e falando só deste dois — nos custou em desemprego, perda de receita fiscal dos estados-membros, perda de confiança creditícia, perda de solvência, perda de know-how criativo construído ao longo de décadas por empresários e trabalhadores, perda de capacidade de investimento interno, perda de riqueza, perda de futuro?
Queira perdoar-me o tom algo emotivo de desabafo com que aqui e agora lhe escrevo, mas é que tudo isto é extremamente grave e ninguém parece disposto a parar para pensar nisto por cinco minutos que sejam, e haveria tanto mais a dizer. Em qualquer recurso, espero voltar a ver estas e muitas outras questões aqui tratadas.
Meus melhores cumprimentos e continuação de Boas Festas,
Luís F. Afonso, do Japão
Caro Luís Afonso, não discordo de nad do que diz, antes pelo contrário. A bolha finaceira rebentou porque «encontrou» tudo o que descreve, mas não deixa por isso de ser uma realidade.
Muito bom 2012 aí a Oriente...
É evidente que as transferências maciças de fundos -capital-, das zonas desenvolvidas para os países emergentes, com a deslocalização das áreas de fabrico por troca com custos de mão de obra muito mais baixos, está na origem de toda a crise Ocidental, mas a culpa é de quem?
Quem permitiu, melhor quem arquitectou, a criação de zonas francas, para melhor acolher e distribuir os fluxos financeiros de todo o Mundo?
Quem são os grandes entusiastas da Globalização?
Quem mais lucrou com a informatização e robotização lançada nos anos oitenta?...
-Lembram-se dos argumentos lançados na altura para adormecer as nossas mentes, dos meios tempos de trabalho sem perda de retribuição, dos tempos de lazer e de cultura?
-Não foram concerteza os trabalhadores Ocidentais -embora o seu dinheiro também esteja envolvido- que criaram este edifício monstruoso, assente em corrupção e mentiras...
Acredito num Mundo global em que o nível de vida de todos os seres humanos se aproxime o mais possível, mas como as coisas estão a ser conduzidas essa aproximação dar-se-à de forma completamente inversa...Neste momento só vejo uma solução, o Ocidente fechar-se sobre si e relançar a sua Economia dentro das suas fronteiras, ainda que para isso tenha que abandonar os fluxos financeiros que estão já longe do seu alcance, não descurando quem lá colocou esse formidável meio de pressão...Isto é, convidando quem saiu a lá permanecer permanentemente...
Absolutamente de acordo, MP.
Pessoalmente também não vejo outra saída.
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