Morreu hoje e a notícia não me encontrou desprevenida: sabia que estava muito doente, não publicava as suas magníficas crónicas no Jornal de Notícias desde fim de Julho.
Neste momento, tudo está a ser dito sobre a pessoa, a obra, republicam-se excertos de poemas. Eu percorro este blogue e registo, sem medo do chavão, que é um pouco dele que morre com Manuel António Pina, tantas foram as vezes que o citei, que o transcrevi, que o comentei. Já disse algures que a última coisa que fazia à noite, antes de fechar este computador, era ver se já estava online a sua crónica do dia seguinte.
Morre também um dos meus leitores: sei que passava por aqui regularmente porque mo disse mais de uma vez em privado e fê-lo também em público, em entrevista publicada na revista LER, há menos de um ano – eternamente grata.
Mas os nossos contactos tiveram início há quatro anos, quando lhe pedi para publicar alguns dos seus textos nos «Caminhos da Memória». Teve então início uma troca de mails que guardo como tesouros e que agora reli com emoção. Eram sempre muito longos, naquilo que o próprio confessava ser uma espécie de «desforra» do espartilho imposto pela limitação do número de caracteres nos textos a serem publicados em jornais – «o morto tem que ser feito exactamente à medida do caixão (...) mas, às vezes, o morto é grande de mais para o caixão disponível e torna-se particularmente penoso escolher o que dele tem que ficar de fora».
Falava sempre dos gatos e tinha um magnífico sentido de humor. Um dia comentou uma «enorme calinada» que não tinha conseguido corrigir a tempo no texto que enviara umas horas antes para o jornal: «Troquei a Sierra Maestra pela Sierra Madre. Confundi Fidel com Pancho Villa (por quem aliás, tenho, apesar de tudo, mais simpatia do que por Fidel). O dr. Freud teria aqui motivo para um parágrafo na "Psicopatologia da vida quotidiana", eu só tenho vontade para, como quando era miúdo, meter a cabeça debaixo dos cobertores e passar assim o fim-de-semana.»
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3 comments:
Não sabia. Lamento profundamente a partida precoce de Manuel António Pina. Senti sempre uma grande empatia por este Homem com quem partilho a poesia e o amor pelos gatos... e por todos os animais.
Boa tarde!
É de facto um dia muito triste para a Poesia, para a Cultura, para a Intervenção Cívica. Sou de há muito leitor de MAP nos livros, no JN; assisti à sessão do "Porto de Encontro" em Abril. E vou chegar à última página do JN na esperança de ser hoje que ele regressa...
Um abraço.
Fernando Oliveira
Também eu fico muito triste com a partida deste Homem tão bom, tão frontal, tão generoso.
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