16.11.12

Carga policial: aos costumes disseram nada



Dos partidos com representação parlamentar, PSD, CDS e PS tomaram uma posição clara sobre a actuação da polícia nos incidentes da passada quarta-feira: louvaram-na, como seria de esperar. Dos outros três, dois remeteram-se ao silêncio (PCP e Verdes) e um (Bloco) a um insistente «nim», nomeadamente nas pessoas dos dois novos coordenadores, em entrevista que deram ontem à RTP (ouvir desde o início até ao minuto 4:43): limitaram-se a sublinhar a importância da greve e a afirmarem-se contra toda e qualquer violência – foi curto. Silêncio também das organizações sindicais.

Repito o que já disse ontem: não se trata, de modo algum, de bater palmas a quem atirou pedras, mas sim de perceber por que razão essas pessoas não foram isoladas assim que começaram (era fácil, se se tratava de meia dúzia de arruaceiros, como disse o ministro Miguel Macedo) e, sobretudo, de repudiar e pedir explicações quanto à carga indiscriminada que se seguiu. Era o mínimo que esperaria ver da parte de muitos – em vão, infelizmente, pelo menos até agora.

Que eu tenha lido, só a Amnistia Internacional se posicionou inequivocamente, reprovando o «comportamentos violentos por parte de um pequeno grupo de manifestantes», mas condenando «o uso excessivo da força por parte da Polícia de Segurança Pública (PSP) contra manifestantes que pacificamente exerciam o seu legítimo direito de protesto» e exigindo «a abertura de um inquérito às circunstâncias em que decorreu a actuação das forças de segurança, bem como os termos em que foram efectuadas detenções».

Será que é tão difícil assim «arrancar» mais posições razoáveis e inequívocas como esta? Porquê exactamente? Não se percebe o que aí vem em termos de repressão? Está- se à espera de quê para prevenir, na medida do possível?

Entretanto, há textos que vale a pena ler: 

* Uma longa reportagem no Público de hoje: Quem é que atirou a primeira pedra?
 
* No «Passa Palavra»: A quem serve o triunfalismo? 
 Deste, destaco o último parágrafo que transcrevo:



Notas finais sobre a polícia 

Nos últimos tempos, a multiplicação das manifestações e o nível de actuação policial sobre as mesmas tem originado um debate de surdos: de um lado, o «mata, pisa e esfola» o polícia, do outro o «abraça o polícia, que ele é trabalhador». Relativamente a este último argumento, a carga policial sobre centenas de pessoas que se manifestavam em solidariedade com a greve veio a demonstrar a sua fiabilidade. Tal não significa, contudo, que estejamos perante uma horda de bárbaros que se deixam dominar por uma pretensa irracionalidade. O sangue que no fim dessa tarde manchou o pavimento das ruas foi o resultado, antes, de uma operação cirúrgica, ou seja, de um cenário que foi previsto, ordenado e no final aplicado. É esta capacidade de consequência que deve suscitar a maior das preocupações.

Não obstante a resistência oferecida nas imediações da assembleia, assistimos a uma operação policial que se estendeu no espaço e no tempo, chegando a efetuar diversas detenções no Cais do Sodré. De acordo com alguns relatos divulgados nas redes sociais e nos meios de comunicação social, não só estas foram produzidas de forma arbitrária, como os direitos dos detidos a uma representação legal foram violados. Ficámos igualmente a saber que a recolha de imagens realizada pela polícia durante as várias manifestações, à margem do parecer negativo da Comissão Nacional de Proteção de Dados, poderá vir a ser utilizada na identificação e responsabilização judicial dos «profissionais violentos». Tudo isto, importa mais uma vez realçar, não deriva de uma disfunção do aparelho policial e judicial, mas sim da concretização de uma estratégia.

Se compararmos a prática das autoridades nas manifestações de 15 de Setembro e de 14 de Novembro, constatamos diferenças de actuação e não de essência. Na primeira, a reacção perante o abraço de uma jovem de 18 anos não foi diferente do comportamento face ao arremesso de garrafas. A segunda, concomitantemente, pautou-se pela mesma receita: tudo a eito, sem grandes diferenças, pois ordens… são ordens.

Não existe qualquer dúvida da violência que foi praticada pela polícia sobre os manifestantes. Todavia, o facto de estarmos a falar de uma instituição que detém o seu poder de monopólio a nível interno torna difícil distinguir o que é uso e o que é abuso. A lei e os «direitos humanos» continuam, certamente, a contar com a Ordem dos Advogados e com a Amnistia Internacional. Mas a sua vinculação passa apenas a fazer parte das contas e não a definir a conta. 
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6 comments:

Helena disse...

É exatamente assim. Não lhe poria, nem lhe tiraria uma vírgula que fosse.
E ando, eu também, a dizê-lo desde anteontem.

Jorge Conceição disse...

Em relação ao Bloco acho que, apesar de não ser muito dura, não se deve omitir que a Eurodeputada Marisa Matias tomou posição (naquele programa que anteriormente era do Miguel Portas). Entre outras coisas ela perguntou (e o Miguel Cardina sublinhou) porque é que, se eram apenas meia dúzia de desestabilizadores profissionais (nas palavras de Miguel Macedo), a polícia feriu cem pessoas e prendeu trinta...

Joana Lopes disse...

Jorge, Há meia dúzia de gatos que vêem o vídeo da Marisa, a RTP tem milhões de telespectadores.

Jorge Conceição disse...

Pois... estou às avessas!... Raramente vejo TV e "consumo" muito rádio (Antenas 1 e 2)...

Dias disse...

Cara Joana Lopes, também senti essa generalizada retracção, que parece ser transversal a partidos e instituições, na condenação da força desproporcionada usada pelo poder. Enfim, uma tal contenção só poderá ser vista como uma conveniência dentro da democracia burguesa (onde nós também vivemos, claro, mas de forma relativa…).
Afinal, camaradas, o que são meia-dúzia de pedradas contra a violência e a injustiça quotidianas?
Post scriptum: não ouvi nem ví, mas tem o meu apreço a intervenção da Marisa Matias.

Tripalio disse...

Ok, fico à espera para que os muito indignados contra as pedras ( mas nada fizeram estando na manif) tentem parar as pedras quando a palhaçada começa. Tb concordo que a polícia foi desproporcional, agora o que digo é que estes protestos abrem portas a mais repressão. Estarei errado. Vejo muita gente que adora ver estas imagens. dizem se teoricamente contra a violencia , mas adoram na....