O texto de Sandra Monteiro em Le Monde Diplomatique (edição portuguesa) deste mês:
«A crise política continua. Tem rostos concretos, que entram e saem do governo, mas também causas mais profundas. As causas conjunturais resultam de termos entrado numa fase nova da crise económica e social: as políticas de austeridade passaram a ser vistas pela população como parte do problema, e nunca da solução, mas apesar disso o executivo anuncia novas escaladas de cortes nas despesas públicas que, a serem aplicadas, teriam efeitos absolutamente devastadores. As causas estruturais prendem-se com práticas já antigas: a promiscuidade e o conluio entre os poderes financeiro e político, ou entre áreas mais agressivas do capital e sectores do Estado cada vez mais permeáveis e mais dependentes desse mesmo capital. Com a crise económica e social a aprofundar-se, o uso e abuso destas portas rotativas por parte de gestores financeiros e detentores de cargos políticos, lesando o interesse público e garantindo lucros privados, gera contradições que manterão a crise política, sejam quais forem os seus rostos.
Os episódios mais recentes da crise política estão a ampliar a compreensão de como opera a engenharia neoliberal – apoiando-se na globalização financeira e na captura do Estado pelos seus gestores e produtos, com a ajuda de instituições europeias e internacionais. Esta percepção pública é fundamental para se entender os interesses divergentes em jogo, que nenhuma «salvação nacional» resolveria, e para que se lute por soluções políticas capazes de afrontar as mil e uma formas de extorsão e de opacidade escondidas atrás da obediência servil aos mercados financeiros.
Durante muito tempo, tudo foi feito para que os achássemos abstractos, quase do reino da ficção. A economia real era a outra, a que produzia os bens e produtos necessários aos nosso consumo, circulação, comunicação, etc.. Nos jornais, as páginas de economia vinham no fim, para especialistas, e as notícias sobre produtos financeiros ou variações bolsistas pareciam ainda mais distantes, para o cidadão comum, do que os engarrafamentos em Lisboa ou no Porto diariamente levados por rádios e televisões a pacatas e recônditas aldeias serranas pareceriam aos seus habitantes. Caímos na armadilha da indistinção entre dualismo e dualidade. Como agora sabemos, não estamos perante dois mundos separados, um «cá» e um «lá», como no dualismo, mas perante realidades interligadas, dualidades, que interagem «aqui» de acordo com interesses e relações de forças.»
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