27.5.14

Eleições, futebol e rusgas policiais



A crónica de Diana Andringa, hoje, na Antena 1:

Sim, eu sei, as eleições foram anteontem, se calhar era delas que devia falar. Mas não só já muitos falaram antes de mim, como, para dizer a verdade, não vi nelas nada de tão surpreendente que valha a pena sublinhar.

Se fôssemos capazes de evitar tomar desejos por realidades, não nos surpreenderia ver na Europa as manifestações de desconfiança nos partidos a que convencionou chamar-se «do arco do poder» (lá terá de se começar a pensar numa nova designação...), o crescimento de partidos xenófobos, ou, em Portugal,o caso Marinho Pinto e a fortíssima abstenção.

Tenho que admitir que a abstenção me choca. Ou até, para ser franca, que me ofende. Afinal, durante 48 anos, milhares de pessoas lutaram, enfrentaram a prisão, a tortura, até a morte pelo direito ao voto e, poucos dias depois de festejaram o quadragésimo aniversário do fim da ditadura, 66% dos eleitores recusam esse direito?

E depois lembro-me que, na véspera, houve futebol. Os partidos que, a meu ver bem, se indignaram com a conferência do Banco Central Europeu em Sintra, não se preocuparam com o facto de, nos últimos dias, os noticiários terem dado enxurradas de notícias sobre o futebol, enquanto que, não fôra a indignação de Miguel Esteves Cardoso, proclamando, em crónica no Público, «Nós não merecíamos tal fascismo», passavam em claro a prepotência policial, fosse no mandar parar de automoblistas, fosse, pior, nas rusgas que se vão sucedendo, já naturalizadas por quem as sofre, nas estações de acesso a Lisboa. Aceitam-se as rusgas policiais, a alarvidade de alguns adeptos, demonstrada na Praça da Figueira, as horas de glorificação dos jogadores de futebol, erguidos em ídolos da Nação. E depois, nas eleições, esperamos que votem? Afinal, também eu tomo desejos por realidade.

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