5.5.14

Se o mundo fosse apenas uma anedota



Confesso que nunca achei muita graça ao hábito tão americano de começar ou acabar discursos com anedotas e, ainda menos, ao uso sistemático das mesmas no jantar anual da Associação de Correspondentes da Casa Branca, como aconteceu de novo há dois dias.

O presidente dos Estados Unidos pode brincar com coisas sérias, como qualquer outra pessoa, mas nem tanto assim: referir o drama da Malásia para uma graçola ou a Ucrânia para lançar umas farpas sem graça a Putin são puro mau gosto – para não dizer pior. Por isso me parecem bem certeiras estas linhas do Editorial do Público de hoje:

«Obama gracejou sobre Putin no jantar dos correspondentes da Casa Branca. Putin, pelo seu lado, talvez conte piadas sobre Obama no seu círculo restrito do Kremlin. Se o mundo fosse uma anedota, seriam momentos de inócua leveza. O problema é que não é. Na Ucrânia, onde o humor das altas esferas mundiais não chega, morre-se por razões insanas, vizinhos matam vizinhos porque passaram a habitar lados opostos da barricada. E tudo se encaminha para uma divisão sangrenta do país, pasto dos seus próprios ódios. Se não for possível pôr ordem nas facções desavindas, nacionalistas e pró-russos, nada travará a guerra civil e os seus efeitos. Vimo-lo na antiga Jugoslávia, dividida e devastada, sangrada a ajustes de contas e massacres. E vê-lo-emos na Ucrânia, porque ninguém soube evitar a tempo o que era evitável. Se o mundo fosse uma anedota, rir-nos-íamos. Mas ninguém rirá do que, ameaçador, aí vem.» 
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