«Tudo era previsível.
António Costa respondeu à crise do incêndio e prometeu uma ambiciosa reforma da floresta, anunciou que a saúde seria o seu novo tema e, num momento pouco notado, lançou a campanha eleitoral com a Carris e os STCP. Lembrou a conversa de ontem com os generais e garantiu à esquerda que negociaria. Ministros todos na formatura e continuidade para 2018.
No PSD, espreitou o velho PPD. Montenegro tentou levantar as hostes insinuando-se contra Passos Coelho, temos candidato e vai ser mais depressa do que se previa, e para isso radicalizou o discurso da catástrofe: em poucos minutos, o Estado colapsou seis vezes, se bem contei, e até a democracia colapsou de caminho. O SIRESP, contrabandeado para o banco do PSD por um governo PSD-CDS, os créditos mal contados da CGD, idem, o falhanço da videovigilância em Tancos, idem, tudo veio à baila como “colapso do Estado”.
Quanto a Cristas, tentou a pose Portas: vivemos o “falhanço mais básico” da autoridade do Estado e a insegurança é aterradora, “a confiança quebrou-se”. Telmo Correia repetiu o seu número dos oito séculos que caíram na vergonha desta plebe ter tomado o lugar de sua majestade.
Nesta escolha do PSD e CDS está a boa notícia para o governo. Os partidos da direita escolheram desprezar o Presidente (o cuidador do Estado) e abandonar o debate económico. Vão pagar pelas duas opções. Pelo caminho, ensaiam uma curiosa efabulação: o governo não cuidava das contas públicas porque gastava demais e logo com as gorduras, as pensões e salários; agora criticam o governo por gastar de menos. Em resumo, “é verdade que economia cresceu e desemprego baixou” (Montenegro) e “a economia melhorou” (Passos) e fica tudo dito, é o que importa a quem se importa com a vida da gente.
Também à esquerda tudo previsível. Catarina e Jerónimo de Sousa negociaram condições e pediram garantias, a que Costa mostrou querer aceder. Nas entrelinhas, nota-se que o desacordo sobre as leis das florestas é profundo, mas o Primeiro Ministro deu voz aos critérios da esquerda, que aparentemente desagradam ao seu ministro. Têm poucos dias para se entender, ou é melhor adiar a votação das leis para setembro, o que seria um recuo para o governo.
No mais, houve algum desplante. Cristas acha que Costa “deserta” quando vai de férias mas prefere que não lhe lembrem o que ela própria assinou quando era ministra e andava de férias. Passos ainda está zangado por não ser primeiro ministro. Tricas e ninguém se importa com isso.
Tudo resumido, depois de o Estado ter colapsado e sabermos que vivemos em estado de pânico, esperava-se uma ou duas valentes moções de censura para salvar Portugal. Mas, no fim do debate, Passos e Cristas arrumaram as pastas e só pensam em ir de férias, como aliás boa parte da população.»
Francisco Louçã
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