15.9.20

Ventura, a voz do dono

 


«Fazer política é escolher que interesses se defende. André Ventura diz representar "o português comum", mas na verdade quer proteger os interesses dos ricos que querem pagar menos impostos. 

Em 2018, os 10% mais ricos do país ganhavam 8,6 vezes o rendimento dos 10% mais pobres. A desigualdade é enorme, mas é o registo mais baixo de sempre no INE. Sucede que estes dados escondem outras injustiças. Porque no topo dos 10% mais ricos há quem ganhe, por mês, o que um trabalhador com o salário mínimo não leva para casa em três anos de trabalho. É o caso, por exemplo, do presidente do Novo Banco, que recebe 400 mil euros por ano. 

As causas das desigualdades são muitas. Para a maioria, o contexto social e familiar significa falta de oportunidades e uma vida presa ao salário mínimo ou pouco mais. Para muitos jovens licenciados, mil euros é o salário mais frequente, num país em que o salário médio mais alto de sempre, registado em 2019, foi de 1276 euros (bruto). 

Combater os baixos salários e a precariedade é uma forma eficaz de reduzir as desigualdades. A outra são os impostos: quem ganha mais contribui mais, proporcionalmente, para os serviços públicos que beneficiam todos. Assim, o presidente do Novo Banco paga 161 mil euros de IRS ao ano (40% do seu rendimento), enquanto o trabalhador que recebe o salário médio paga 2040 euros (12% do rendimento) 1*. A todos é dada, em troca, a segurança de saber que terão acesso a cuidados de saúde, escola para os filhos e apoio social em caso de necessidade. Parece pouco? Nos EUA, onde não existe um SNS, as dívidas de saúde são a principal causa de falência pessoal e a maior parte dos jovens estão enredados em empréstimo bancários para pagar os estudos. 

Não faltou na História quem tentasse acabar com este modelo de Estado social que é a maior conquista dos trabalhadores contra a selva social e a miséria do século XIX e início do século XX. Não é por acaso que os serviços públicos são tão atacados por figuras com Trump, que deu prioridade à redução dos impostos dos mais ricos. 

Em Portugal, essa é também a proposta do partido Chega, que defende uma taxa única de IRS. Com uma taxa única de 15%, o presidente do Novo Banco pagaria muito menos de metade dos impostos que hoje paga. Ventura beneficiaria de um desconto de 25% nos impostos sobre o seu salário de deputado. Já o Estado perderia receitas essenciais à Saúde e à Educação. Mas é mesmo esse o plano do Chega: no seu programa oficial está o fim do SNS e a entrega das escolas aos privados. Para os mais ricos, que poderiam pagar por estes serviços, isso não é um problema. Para o "português comum", seria o empobrecimento imediato. 

Agora, no Parlamento, o advogado Ventura continua a defender os seus clientes de antes: ricos que não querem pagar impostos. 

1* Simulação simples para casado com dois dependentes e 50% de deduções em educação e saúde.» 

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